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É preciso cuidar da voz Quando perceber desconforto ao falar, é importante conversar com um especialista para saber se há algum problema 22 SAÚDE Instrumento capaz de carregar de uma só vez, mensagens, emoções e atitudes, a voz quando sofre alguma alteração, ou quando não está de acordo com as características esperadas para o gênero, a faixa etária ou a demanda vocal, pode comprometer o desempenho das atividades do dia a dia. E profissionais que têm este instrumento como ferramenta de trabalho devem ficar ainda mais atentos. Do ponto de vista físico, o processo de produção da voz é igual para todos: respira-se, o ar vai para os pulmões, retorna em direção à laringe e encontra as pregas vocais (ou cordas vocais) que vibram, gerando o som. Este, por sua vez, segue em direção à boca, sendo amplificado pelas caixas de ressonância (faringe, cavidade oral, cavidade nasal, seio da face) e modulado pelos articuladores (língua, lábios e véu palatino). É assim que falamos. “Um bom condicionamento do aparelho fonador e uma correta produção da voz não geram desconforto e nem dor”, ressalta a fonoaudióloga Márcia Menezes, coordenadora do Departamento de Voz da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia. São três os principais fatores causadores de distúrbios da voz: as neoplasias, as inflamações e problemas funcionais. As neoplasias são tumores, os quais podem ser benignos ou malignos. No caso dos tumores malignos, o mais frequente no Brasil, como apontam dados da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia, é o câncer de laringe, doença relacionada ao tabagismo e ao consumo de álcool e que pode surgir em qualquer região da laringe, mas se desenvolve com maior frequência na glote, justamente onde ficam as cordas vocais. Rouquidão costuma ser o sintoma principal desse tipo de tumor. As inflamações decorrem da ação de vírus, bactérias ou fungos, que provocam machucados nas pregas vocais e causam rouquidão. Projetar a voz nessas situações requer mais esforço e energia. A gripe é a causadora mais comum dessas inflamações, podendo provocar pigarro em função do catarro que escorre do nariz em direção à garganta ou quando as vias aéreas estão congestionadas, o que provoca o ressecamento da garganta. Já os problemas funcionais são alterações que provocam desconfortos, sem a coexistência de causas físicas que justifiquem a anormalidade da voz. Geralmente, pessoas que sofrem de problemas funcionais costumam usar a voz de forma errada, forçando os músculos ao falar. O especialista deve ser procurado quando o indivíduo sentir qualquer tipo de desconforto ao falar. “É importante lembrar que ao longo da vida a voz passa por modificações, por questões anatômicas ou hormonais. Ao envelhecerem, homens tendem a sofrer uma agudização da voz, enquanto as mulheres sofrem um agravamento. Essas alterações, naturais, não provocam dor”, enfatiza Marcia Menezes. O tratamento de alterações vocais pode ser medicamentoso (em quadros de inflamação, infecção, alergias e refluxo gastroesofágico), cirúrgico (empregado em diversas situações, tais como para remover lesões benignas, como nódulos, pólipos ou cistos, ou malignas, como o câncer da laringe e outros problemas) e terapia fonoaudiológica, esta para os casos comportamentais, com ou sem doenças. “Os médicos otorrinolaringologistas possuem um olhar mais voltado para o bem-estar da estrutura do órgão fonador, de modo a identificar patologias que necessitam de alguma intervenção medicamentosa ou cirúrgica. Já o fonoaudiólogo preocupa-se com funcionamento do órgão fonador, atuando no aperfeiçoamento e promoção da saúde vocal. Existem casos em que o paciente não tem nenhuma doença vocal, mas sente desconforto ao falar, nestes casos de desajuste funcional o fonoaudiólogo é quem intervém”, explica Márcia Menezes. De acordo com ela, é comum as pessoas procurarem o fonoaudiólogo para melhorar o desempenho vocal no trabalho. Motivos estéticos como vozes muito anasaladas, monótonas, grossas ou finas, fortes ou fracas demais, incomodam ou, em algumas profissões, não causam o impacto que se deseja. Consulte um profissional A coordenadora do Departamento de Voz da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia, Márcia Menezes, enfatiza que prevenção dos problemas da voz é muito importante. Ela recomenda ao menos uma consulta por ano com médico otorrinolaringologista e uma com fonoaudiólogo. “Assim como é importante para um atleta ter seu preparador físico, seu ortopedista, para um profissional da voz é importante contar com o cuidado dos especialistas”, exemplifica. Algumas atitudes simples podem ser tomadas todos os dias para manter a voz sempre saudável – a principal delas é evitar o tabagismo. Fumar agride o sistema respiratório e as pregas vocais, causando irritação, pigarro, edema, infecção, além de aumentar a chance de câncer de laringe e de pulmão. Uma boa dieta ajuda a saúde como um todo e, consequentemente, a voz. Isso porque uma má alimentação pode provocar refluxo gastroesofágico, doença em que os ácidos presentes dentro do estômago voltam esôfago acima ao invés de seguirem o fluxo normal da digestão. Como a parte superior do aparelho digestivo está em contato com o aparelho respiratório, o suco gástrico pode alcançar a glote, penetrar na laringe e provocar rouquidão, tosse crônica, pigarro, além de outras complicações. “Ingerir alimentos pesados e muito condimentados, além de causar azia, má digestão e refluxo, dificulta a movimentação do músculo do diafragma, fundamental para a respiração. A matéria prima para a produção da voz é o ar”, salienta a fonoaudióloga. O mesmo vale para consumo de álcool em excesso, substância que tem efeito analgésico e favorece abusos vocais. O sono também influencia na voz. Enquanto dormimos, as energias são recarregadas e a voz depende de um metabolismo altamente energético para ter boa performance. Uma noite mal dormida significa uma voz mais pesada pela manhã, engrossada ou mesmo rouca. Prevenções Uma boa voz também requer controle do estresse e da tensão psicológica ou física. A postura do corpo, principalmente da região de pescoço, ombros e tórax, influencia na qualidade da voz, o que muitas vezes é percebido pelo ouvinte. “Durante a atividade profissional, recomenda-se que o corpo esteja relaxado, um alongamento do rosto e da região cervical ajuda na produção vocal”, orienta Márcia Menezes. Algumas pessoas devem evitar o ar condicionado, justamente aquelas que costumam sentir a garganta ressecada e a voz alterada em ambientes em que o aparelho encontra-se ligado. Isso acontece porque o ar condicionado resfria o ar e retira sua umidade, o que provoca a sensação de secura. Se for impossível evitar ambientes climatizados, é necessário aumentar a ingestão de água durante o período que se permanecer nesses locais. Em dias de uso intenso da voz, recomenda-se exercícios de aquecimento e desaquecimento vocal. O aquecimento tem a função de preparar o aparelho fonador para uso intenso. Este procedimento melhora o funcionamento das pregas vocais, a intensidade e a projeção da voz, além de diminuir o cansaço após o uso prolongado da voz. É uma boa estratégia para manter a qualidade da voz profissional, colaborando com o desempenho, a saúde vocal e com a prevenção de problemas. O desaquecimento, por sua vez, permite que a voz retorne aos seus ajustes naturais, favorecendo uma emissão mais suave.


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