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mente consolidado, porque você tem funcionando as instituições políticas, ainda que de forma ruim. O que o senhor diz do Congresso que aí está? O Congresso é muito ruim. Essa também é uma herança do regime militar, que desprestigiou as instituições parlamentares e exaltou as instituições do Executivo. Você não formou um corpo político que viesse a exercer lideranças importantes porque o Congresso no regime militar não se envolvia nas decisões nacionais. Os parlamentares não participavam e, por isso, os prefeitos e governadores do Estado não tinham interesse de mandar lideranças importantes para o Congresso. Eles mandavam alguém que ficasse nos gabinetes dos ministérios arranjando verba e isso não é um modo de se governar adequadamente o país. Como isso ocorria, o Congresso ficou com esse tipo de composição medíocre, ruim. Em contrapartida, no regime de 1946, qualquer que fosse o partido ou ideologia, havia liderança séria. Todos os partidos tinham homens muito bons, você nunca ouviu falar nessa época em corrupção de deputados ou de partidos. A Constituição prevê inúmeros direitos, como saúde, educação e moradia, que não são cumpridos. Há excessos nessas obrigações? Não existe excesso de direito. Isso é um absurdo, somente gente muito retrograda pode falar que existe excesso na Constituição de direitos, que sequer foram implementados com seriedade. A saúde está bem? A educação está bem? O que falta é qualidade. É só estabelecer um regime mais igualitário que há condições de melhorar esses direitos. A população precisa ser ouvida com mais frequência? Quanto mais ouvir o povo, mais a democracia se tona autêntica. Se o poder pertence ao povo, então, quanto mais as pessoas participarem do processo de decisão governamental, melhor. Não acho, porém, que deva se ouvir a torto e a direito. Essa participação, prevista na Constituição, tem algumas limitações. Mas tomo como exemplo o processo da Constituinte em que foram colhidas 11 milhões de assinaturas com diversas propostas e muitas acabaram adotadas. A Lei da Ficha Limpa também veio de uma participação de iniciativa popular. É sempre conveniente essa audiência popular, que não diminui em nada as entidades parlamentares da Silva 13 administrativas. O voto também tem caráter fundamental para o aprimoramento das instituições de classe, como no caso da OAB e de outras entidades? A eleição corporativa é diferente da popular. Você elege e deve eleger quem vai servir aos interesses de uma classe. Eleição democrática é a eleição política, é o povo que participa. Aqui não é o povo. A eleição na OAB SP, de qualquer forma, é mais democrática do que a escolha por um grupo pequeno. Se você ampliar o leque, como neste caso, o processo eleitoral fica muito mais democrático, mesmo se tratando de corporativo. ro, por exemplo, é antiga, mas está aí. A que criou o Banco Central está aí, prevista na Constituição, não precisa fazer uma lei nova. É antiga, mas está funcionando. A Constituição foi regulamentada no essencial e você tem uma ordem jurídica procedente, com várias leis importantes, como o Código Tributário. O que a Constituição Cidadã traz de mais importante? É uma Constituição que está em vigor regendo os destinos do país. Nenhuma outra sobreviveu tanto tempo sem conflitos constitucionais. Isso significa que ela está satisfazendo aos interesses do Brasil. É preciso ratificar que as crises que têm aparecido são resolvidas com base nela. Isso é importante. Tivemos aí uma série de problemas de ordem jurídica, como o “Mensalão” e tantas outras crises que são resolvidas de acordo com as instituições estabelecidas na Constituição. Temos ainda como exemplo o impeachment de (Fernando) Collor que foi balizado por essa Constituição. A crise toma proporções que, na avalição de especialistas, sequer atingiu o ápice. A presidente Dilma perdeu a legitimidade garantida pelo voto direto? A presidente Dilma Roussef invoca sua legitimação para se manter no poder. A legitimação tem duas vertentes: a da investidura, que se faz por eleição, e a do exercício do poder, que também precisa ter o respaldo popular por via de consciência. Não vou dizer que a Dilma já perdeu essa legitimidade, pois o problema dela é mais de má gestão. Por má gestão você não precisa tirar ninguém. Elegeu-se alguém incompetente, paciência, tem de aguentar até o final. O senhor fala em renúncia da presidente, este é o melhor caminho? Não sei se esse é o melhor caminho, talvez seja o único. Depois de ter assinado um manifesto sobre a renúncia, esclareci em palestra que apoiei a medida, mas quis deixar claro que tem de ser um ato de livre vontade do renunciante, não pode ser um ato coagido, porque neste caso não seria de renúncia livre. Renúncia como os militares impuseram a Getúlio Vargas, é imposição. Ele acabou se suicidando. Então, se ela quiser renunciar, ela renuncia. Caso contrário, não! E vai continuar a levar as coisas tão mal como estão atualmente. O senhor viveu grande parte sob a influência de regimes ditatoriais. Há segurança jurídica hoje para que o país não retroceda na democracia? O Brasil todo passou muito mais tempo sob a égide do regime autoritário. Para se ter ideia, os regimes monárquico e republicano sempre foram autoritários. Além disso, você passou toda a República Velha sujeita ao coronelismo e a oligarquias poderosas. Portanto, se não era ditadura declarada, era regime de força, porque estava concentrada num sistema oligárquico fechado. E, depois, vieram os golpes da ditadura ostensiva, como o de Getúlio Vargas e dos militares. Com relação a retroceder na democracia, acho que do ponto de vista político o regime está razoavel- Jornal do Advogado – Ano XLI – nº 410 – Outubro de 2015 SÃO PAULO O senhor lidera a lista de doutrinadores de Direito Constitucional citados em ações no STF, com 79 citações em 1.003 casos. Qual fator que caracteriza suas ações? Nunca pedi ao Supremo para me citar. Citam porque devem encontrar algo nos textos que ajuda nas suas decisões. É claro que o julgador recorre à doutrina para fundamentar seu voto, sua sentença... É normal que no livro de algum doutrinador tenha elementos importantes para a produção daquele caso que está em julgamento e que determinado ministro recorra ao doutrinador. Eu me sinto muito honrado. O sistema tributário é citado 37 vezes no texto constitucional. A carga tributária do país é justa? A carga tributária poderia ser muito menor e continuar injusta. O que é injusto é o sistema tributário brasileiro. O que é injusto é que essa carga recai muito mais sobre os pobres. Aí é que está a injustiça, ela não é sofrida por quem tem mais recursos. Os empresários se queixam muito, mas ninguém fala dessa injustiça. Ninguém fala que o Imposto de Renda, que deveria ser progressivo, é basicamente um imposto proporcional. Qualquer pessoa da classe média paga 27%. E daí em diante, o rico recolhe a mesma coisa. Isso é que é injusto. As súmulas vinculantes são fundamentais para dar mais celeridade às decisões nos tribunais inferiores? Elas nunca devem ser questionadas? As súmulas vinculantes devem ser questionadas, sim. Até para que sejam reformadas. Eu acho que elas travam o juiz que realmente é quem produz o processo mais perto do povo. Se você tira do juiz a possibilidade de inovação e criação, por via autoritária, se perde muito nessa questão. Como o senhor avalia a atuação do STF? Eu gosto dessa formação do Supremo. Acho que tem dado soluções a problemas importantes, como para a questão das células tronco e dos homoafetivos. Quando que o Supremo julgou gente rica ou gente bem posta, como ocorreu no caso do “Mensalão”? O Joaquim Barbosa foi importante, mas as pessoas se esquecem dos outros ministros. O dia que o Ayres Britto tomou posse como presidente no Supremo, falei para ele julgar o “Mensalão” e ele me respondeu que iria julgar. E logo ele começou a preparar e dirigiu muito bem o Supremo naquele período decisivo para o Brasil. Ele foi mais importante que o Joaquim Barbosa, que não faria nada sozinho. Porque os advogados são simpáticos ao parlamentarismo? Se tivéssemos parlamentarismo, essa crise já teria acabado, inclusive do ponto de vista econômico. Esse governo já teria caído e teríamos formado um novo governo, sem trauma nenhum. Mas o presidencialismo tem algumas dificuldades para resolver problemas de governo, não é apto para isso, porque as crises recaem sobre a pessoa do presidente, com muita clareza. “Não existe excesso de direito. Isso é um absurdo, somente gente muito retrograda pode falar que existe excesso de direitos na Constituição”


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