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CAPA Caminhos Abrir espaços para a mulher é a principal forma de acabar com a cultura machista do país. A OAB SP promove ações para tentar acabar com o desrespeito Se por um lado nunca se abriu tanto espaço para discussões acerca de temas pertinentes ao universo feminino como em 2016, por outro, casos como o do estupro coletivo da adolescente do Rio de Janeiro revelam o quanto é preciso a sociedade avançar para mudar a mentalidade que incentiva a violência contra a mulher. Basta ver que ainda se questiona o comportamento da vítima, as roupas que usa, ou os lugares que frequenta. O mesmo não ocorre em relação à conduta dos agressores. Há exemplos de iniciativas que visam dar mais respeito e campos para atuação das mulheres. Na política nacional, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) lançou uma campanha que incentiva a participação feminina nos pleitos eleitorais. No Judiciário, elas ocupam lugares sempre destinados aos homens, caso de Laurita Vaz, a primeira presidente do Superior Tribunal de Justiça. Na legislação, o sexo antes frágil já tem uma lei que faz dez anos: a Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006). No âmbito institucional, na Ordem dos Advogados do Brasil, 2016 foi proclamado o Ano da Mulher Advogada da OAB. O objetivo é reafirmar a inclusão das mulheres nas instâncias deliberativas da Ordem. Além disso, entrou em vigor em janeiro o Plano Nacional de Valorização da Mulher Advogada que estabelece metas para fortalecer a atuação das advogadas até 2017. Para propagar essa mudança comportamental, a Secional paulista da Ordem trabalha em rede com um grupo composto por mais de 300 integrantes, que atuam de maneira planejada por meio de assessorias regionais e coordenadorias específicas. O caminho para a igualdade entre os sexos, porém, ainda é longo e requer luta na opinião da advogada Luiza Nagib Eluf, procuradora aposentada de Justiça do Ministério Público de São Paulo, e membro consultora da Comissão da Mulher Advogada da OAB SP. Ela acredita que essa equidade só será possível quando as mulheres passarem a ocupar os cargos de poder. “Temos de ser 51% do Congresso Nacional, 51% do Supremo Tribunal Federal, porque essa é a proporção de mulheres na população brasileira”, pondera a advogada para acrescentar que, atualmente, as mulheres ocupam menos de 10% das cadeiras da Câmara dos Deputados. “Com essa proporção, nós continuaremos sendo estupradas e esmagadas”. O presidente da OAB SP, Marcos da Costa, vê na reduzida participação da mulher na política o reflexo de uma cultura machista existente no país. “Entre os países das Américas, o Brasil só supera o Haiti em porcentual de participação feminina nos seus parlamentos”. Uma saída para o aumento da representatividade feminina no Congresso Nacional está sendo discutida na Câmara dos Deputados. Tramita na casa a Proposta de Emenda à Constituição (PEC nº 134/15) que reserva 16 percentual mínimo de representação para homens e mulheres no Poder Legislativo. De acordo com o texto, ele será aumentado de forma gradativa: 10% das cadeiras na primeira legislatura, 12% na segunda e 16% na terceira. A medida alcançaria não só a Câmara dos Deputados, mas também as Assembleias Legislativas, a Câmara Legislativa do Distrito Federal e as Câmaras Municipais nas três legislaturas subsequentes à promulgação da emenda. Na opinião da presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB SP, Kátia Boulos, além da participação da mulher nas casas legislativas, que levaria à criação de normas mais eficazes para a promoção da igualdade, faz-se necessária uma mudança cultural. A advogada recorda que num passado não tão distante, a lei estabelecia padrões rígidos de comportamento apenas às mulheres. “Não se pode perder de vista que na legislação brasileira, até 2005, ainda repousava a concepção de que mulher honesta era aquela que atendia ao padrão sexual estabelecido pelos atributos da virgindade, fidelidade e recato. Como se as demais mulheres merecessem a qualificação de desonestas, ou pudessem ser desrespeitadas, negligenciadas e violentadas”, reforça Kátia Boulos, que acredita na educação como um caminho para essa transformação. A proposta da presidente da Comissão da Mulher Advogada, que prevê uma mudança de cultura a partir dos bancos escolares, está entre as 11 elaboradas e aprovadas por aclamação no “Congresso Estadual sobre Violência contra a Mulher”, que contou com painéis que debateram a cultura do estupro, a culpabilização da vítima, a responsabilização penal em crimes de estupro, o combate à violência por meio da educação, a sociedade do espetáculo e a exposição de crimes contra a mulher. O evento, realizado pela Secional paulista da Ordem em 4 de junho, no Teatro Gazeta, foi encerrado por um ato de repúdio da entidade nas escadarias do Edifício Gazeta dando um basta à de violência sexual contra a mulher. Na ocasião, também foi lançada a campanha da entidade com a assinatura: “Uma vítima de estupro a cada 11 minutos. Basta de violência contra a mulher”. Empoderamento Especializada em Direito Digital, Camila do Vale Jimene abordou os temas “sociedade do espetáculo” e “exposição de crimes contra a mulher na internet”. Para a advogada, a educação também é o caminho para evitar a publicação de cenas íntimas nas redes sociais. “Falta hoje o que chamamos de empatia, a dificuldade de se colocar no lugar do outro antes do compartilhamento desses conteúdos. Por isso, o mais importante é conscientizar a todos de que passar um conteúdo para frente não é só uma questão de valor, mas também uma questão legal, pois existe responsabilização com relação a isso no país”, explicou. Proposta de combate à violência contra a mulher 1. Atuar junto à Secretaria da Educação do Estado de São Paulo para promover os direitos humanos e a superação da questão de gênero a partir da infância, visando a transformação da cultura de violência; 2. Contribuir para os Programas da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, estabelecendo parcerias e convênios para a formação do professor mediador, fomentando a educação digital nas escolas e demais programas dessa Secretaria; 3. Concitar a formalização de registros de violências praticadas contra a mulher junto aos órgão públicos; 4. Fomentar (junto aos órgãos competentes) a prestação de assistência jurídica integral às vítimas de violência – mulheres, crianças e adolescentes – com acompanhamento do inquérito até a conclusão dos procedimentos judiciais; 5. Fomentar (junto aos órgãos competentes) a nomeação de assistente de acusação nos processos de violência praticada contra a mulher; 6. Diligenciar junto aos órgãos competentes para que as Delegacias de Defesa da Mulher (DDM) funcionem 7 dias por semana, 24 horas por dia; 7. Fomentar a formalização de convênios com o Conselho Regional de Medicina (CRM), com o Conselho Regional de Psicologia (CRP) e com o Conselho Regional de Serviço Social (CRESS) para realizar o atendimento multidisciplinar da vítima de violência; 8. Prestar atendimento à mulher vítima de violência em trote universitário, mediante atuação conjunta com a Coordenadoria de Políticas para a Mulher do Estado de São Paulo e instituições de ensino superior, como a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, ouvidas as representações discentes e demais entidades participantes do respectivo projeto; 9. Propugnar junto aos órgãos competentes pelo estabelecimento de prioridade na tramitação dos inquéritos nos casos de violência contra a mulher, ao lado dos crimes contra as crianças e adolescentes; 10. Propugnar junto aos órgãos competentes pela inserção das disciplinas de Direitos Humanos, Violência de Gênero e Inclusão Social nos cursos jurídicos; 11. Propugnar junto aos órgãos competentes por perícia técnica especializada para crimes contra a mulher com atuação em todo o Estado de São Paulo.


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