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O lobby precisa sair da clandestinidade 5 Jornal do Advogado – Ano XLII – nº 419 – Agosto de 2016 SÃO PAULO Regulamentar a atividade pode trazer transparência às negociações e ajudar a prevenir a corrupção A cada governo e legislatura, escândalos que envolvem as relações entre autoridades e grupos econômicos resultam num entendimento distorcido do lobby. A defesa de interesses junto a membros do poder público, porém, não representa necessariamente uma atividade ilícita. Qualquer cidadão, empresa ou entidade de classe tem o direito de dialogar com seu representante no Legislativo ou Executivo para promover o debate e defender seu ponto de vista. O problema, conforme avalia Adib Kassouf Sad, presidente da Comissão Especial de Direito Administrativo da Seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil, está na falta de transparência. “O lobby, em si, deve existir e ser regulamentado. É uma prática sadia se for adequadamente exercida, porém, como todas as outras coisas, se as pessoas nele envolvidas não souberem respeitar os limites da cidadania, do Estado Democrático de Direito e da ética, a atividade é corrompida”, considera. Existem duas versões para a origem do lobby no mundo. A primeira garante que se trata de uma expressão norte-americana criada pelo então presidente Ulysses Grant (1864-1869) para descrever a atuação das pessoas que o abordavam no lobby do hotel Willard, onde costumava apreciar charutos e conhaque após o fim do expediente. Grant passou a chamá-los de ‘lobistas do hotel Willard’ e a manifestação teria se popularizado. A segunda versão histórica para o termo relata que teria surgido na Inglaterra, nos corredores e antessalas do parlamento (lobby ou lobbies), onde cidadãos se reuniam na tentativa de se aproximar e influenciar os parlamentares que estavam prestes a votar projetos de leis. Regulamentada nos Estados Unidos (EUA) desde 1946, a atividade requer dos lobistas registro e prestação de contas em relatórios trimestrais com informações como: valores gastos, a área na qual se fez o lobby e o departamento alvo. Luciano Caparroz Pereira, presidente da Comissão Contra Caixa Dois nas Campanhas Eleitorais da OAB SP, afirma que este é o tipo de transparência necessária para prevenir o tráfico de influência e a corrupção. “Ocorre que hoje no Brasil não sabemos quem são os lobistas, como são usados e quais são as origens dos recursos, além do método de abordagem”, pontua. Por outro lado, os parlamentares americanos utilizam os conhecimentos dos lobistas para tomar decisões sobre assuntos em que não têm informações profundas. “Muitos parlamentares declaram abertamente que nesses casos convocam lobistas de posições contrárias para que cada um defenda sua posição e eles possam formar um juízo em relação à matéria”, descreve Caparroz. Adib Kassouf Sad acrescenta que a segurança jurídica também possibilitou a evolução do trabalho realizado pelos lobistas nos EUA. “Atualmente, temos escritórios inteiros que trabalham no país preparando laudos, manifestações e pesquisas de opinião pública para embasar os argumentos e convencer os parlamentares sobre este ou aquele ponto de vista”, conta. “Em contrapartida, no Brasil, alguns projetos são votados sem estudo, sem discussões profundas sobre questões éticas, técnicas, jurídicas, de meio ambiente ou engenharia. Precisamos de argumentos técnicos que tornem esses debates possíveis”, contextualiza. Tentativas de regulação Normas para a atuação de lobistas no Congresso e em outros poderes enfrentam dificuldades para prosperar. A primeira matéria que se aproximou de retirar o lobby da zona cinzenta entre o tráfico de influência e a legítima defesa de interesses tem quase 30 anos, trata-se do Projeto de Lei do Senado nº 203/ 1989 proposto pelo ex-senador Marco Maciel. Ele foi aprovado pela casa e enviado à Câmara dos Deputados, onde foi considerado inconstitucional pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) “por se tratar de matéria tipicamente afeta à organização e ao funcionamento de uma das casas do Congresso Nacional”. Outra proposta que está sendo analisada pela Câmara dos Deputados é o Projeto de Lei nº 1.202/ 2007, do deputado Carlos Zarattini (PT-SP), que determina o credenciamento dos lobistas, declaração de matérias de interesse, apresentação de relatórios anuais de gastos e atividades. Impõe, ainda, um ano de quarentena para que funcionários públicos e detentores de cargos eletivos possam atuar, e veda o uso de presentes, cortesias, gentilezas e favores para congressistas. Para Jorge Eluf Neto, presidente da Comissão Especial de Controle Social dos Gastos Públicos da OAB SP, a regulamentação do lobby é uma forma de prevenir a corrupção e, por isso, ela está entre as 12 propostas da campanha “Corrupção, Não” da Seção São Paulo da OAB lançada no ano passado. “A ideia é tirar da clandestinidade. Trazer luz para uma atividade que hoje ocorre nas sombras”, disse Eluf para acrescentar que no momento em que a lei torna a relação clara e transparente, as irregularidades diminuem. Reconhecendo a importância do tema, o ministro da Transparência, Fiscalização e Controle, Torquato Jardim, afirmou que pretende regulamentar a atividade na esfera do governo federal. Quando esteve na sede da Secional paulista da Ordem, em 17 de junho, foi apresentado ao ministro pelo presidente da entidade, Marcos da Costa, a ação da Secional paulista da Ordem de combate à corrupção. Na semana seguinte, Jardim editou as portarias nºs 1.078 e 1.081, criando um grupo de trabalho para realizar estudos e apresentar propostas de regulamentação da atividade de relações governamentais para a defesa de interesses (lobby), observando os aspectos práticos envolvidos e as questões relacionadas à prevenção e ao combate à corrupção, à integridade nas reações público-privadas e à transparência. ATIVIDADE LÍCITA: Para Jorge Eluf, a regulamentação do lobby é uma forma de prevenir a corrupção TRANSPARÊNCIA: Luciano Caparroz acredita que a prática ajudará a prevenir o tráfico de influência José Luís da Conceição


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