Page 15

Jornal420_site.pmd

Manus 15 década de 40, quando a CLT entrou em vigor, tínhamos uma massa trabalhadora muito mais homogênea. Hoje, temos trabalhadores mais esclarecidos e formas de trabalho das mais variadas possíveis. Não é possível querer enquadrar todos no mesmo modelo. É lógico que a negociação com o trabalhador comum tem de ser essa protecionista da CLT. É para isso que o Direito do Trabalho existe: para tentar equilibrar a relação de dominação do empregador com o empregado. O trabalhador pode pedir revisão da decisão tomada em juízo ? Pode. Existe o artigo 468 da CLT que diz: “Nos contratos individuais do trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento e, ainda assim, desde que não causem prejuízo ao empregado”. Mesmo fazendo acordo, eu posso afirmar que não sabia que seria prejudicado. Constatado o prejuízo, o advogado pede para tornar a decisão sem efeitos. É preciso observar, no entanto, os casos de profissionais que sabem bem o que estão fazendo. Imagine eu, professor de Direito do Trabalho, faço um acordo e depois vou dizer para o juiz que não sabia o que estava assinando? É imperdoável! Para reduzir o número de conflitos, a Justiça incentiva a conciliação. Como lidar com isso? É a forma ideal para resolver todas as questões com a Justiça. O importante é ter mecanismos seguros. Algumas experiências não oferecem a segurança necessária para o empregado que pode ser induzido a fazer o que ele não quer. O mesmo ocorre com algumas empresas que perdem tempo, dinheiro, vão numa conciliação, o cidadão aceita, e depois vira as costas e entra com um processo. Por isso, é importante a presença do advogado nos acordos. O primeiro juiz da causa é o advogado. Ao ouvir a história, tem de orientar o cliente no caminho correto. Se o processo for conduzido de forma correta não tem o que ser discutido judicialmente. Para isso, basta alegar na defesa – ou no pedido – aquilo que a gente sabe que pode ser provado. Se não fizer isso, você contamina seu trabalho. Quando o juiz percebe que você não tem razão em um fato, acaba contaminando negativamente o processo. O presidente da CNI disse que o brasileiro teria de trabalhar 80 horas por semana. Nem o presidente da CNI estava levando a sério o que disse. Ele quis usar, espero, um exagero para sugerir que o brasileiro trabalha pouco. Oitenta horas por semana não podem ocorrer, por uma questão muito simples: a Constituição determina que são 44 horas. Algumas categorias, talvez, tenham uma jornada menor do que as outras, mas, no frigir dos ovos, o brasileiro trabalha muito. Ainda mais nas grandes cidades em que as pessoas levam quase três horas para SÃO PAULO chegar ao trabalho, somando uma jornada de dez horas, você tem aí 16 horas fora de casa. O tempo que sobrou ele vai se alimentar, conviver com a família e dormir. Esse tipo de vida é sacrificante. Emprego não é só salário, é proteção previdenciária e à saúde. Quem emprega reclama que é caro. O trabalhador precisa do emprego. Como conciliar isso? Lembro sempre da visão dos economistas quando falam que o empregado que recebe R$ 1.000,00, custa R$ 2.000,00. É exagero, mas é verdade que o custo é muito alto. Ele engloba as responsabilidades sociais, que são 13º, férias etc., mas incluem também os encargos tributários, que deveriam ser excluídos, porque encarecem as relações e não retornam para os empregados, nem para os patrões. O estado tem de assumir seu papel e reduzir a carga de impostos sobre os salários. Se fizer isso, vai estimular o empregador a abrir mais postos de trabalho, ao mesmo tempo que o empregado pode receber um pouco mais. É indevida a multa sobre o FGTS na dispensa sem justa causa? Podíamos trocar essa multa por aquilo que ainda não teve condições políticas para ser regulamentada. A multa era de 10%, desde 1966. Quando chegou a Constituição de 1988 ficou estabelecida proteção contra a demissão arbitrária ou sem justa causa, nos termos de uma lei complementar. Faz 28 anos e essa lei ainda não foi editada. Seria mais saudável reduzir essa multa para 10%, 15% e garantir às pessoas estabilidade no emprego. Não é criar uma estabilidade absoluta. As empresas poderiam mandar embora por motivo técnico, disciplinar, financeiro. O que muda nos direitos trabalhistas na era digital? Muda o conceito de jornada de trabalho. Antigamente, todos trabalhavam no estabelecimento do empregador. Na era digital, você trabalha em outro espaço, que pode ser sua casa, por volume de trabalho. Tem de mudar o paradigma: quando se trabalha perto do empregador, analisa-se o produto do trabalho. Mas quando ele deixa de cumprir um requisito essencial para ser empregado que é a pessoalidade, a subordinação, as exigências são outras. A CLT diz que qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não pode afetar direitos adquiridos. Até onde isso pode ser negociado pelas partes? O melhor seria indenizar o passado trabalhista e partir para uma nova contratação. Não vamos esquecer que para o Direito do Trabalho interessa muito mais a realidade dos fatos. Posso combinar de ser seu prestador de serviço autônomo, mas, na prática, eu recebo ordem e tenho de cumprir horário. Sou empregado. Para o Direito do Trabalho vale o que realmente acontece. Jornal do Advogado – Ano XLII – nº 420 – Setembro de 2016 A mulher é discriminada no trabalho frente aos homens. Quando essa questão trabalhista será solucionada? Infelizmente não dá para o Congresso fazer uma lei proibindo a discriminação. Esse problema da mulher que serve para substituir, mas não é efetivada como chefe é uma dificuldade da própria sociedade. Quando é que vai mudar isso? Na medida em que a sociedade for percebendo que é preciso tratar homens e mulheres da mesma forma. Hoje eu vejo um avanço: algumas funções que a mulher não podia exercer, abriram espaços para elas. Sobre a remuneração, a Constituição e a CLT dizem: “não pode haver distinção entre homem e mulher fazendo o mesmo serviço”. Mas a sociedade ainda não absorveu esse conceito. Até onde vai o direito de greve e o dever do trabalhador nos serviços essenciais à população? A relação que a gente tem com esse tipo de greve é de repulsa, porque é o cidadão que acaba prejudicado. Mas há uma questão central no artigo 9º constitucional, assegurando o direito de greve. Os representantes dos trabalhadores precisam avaliar que tipo de greve fazer. Também devem analisar se o fato de prejudicar a população não irá provocar um efeito ruim. Os jovens são as maiores vítimas do desemprego no mundo, segundo levantamento da OIT. Quais as consequências? A falta de postos de trabalho pode empurrar esses jovens para o ilícito, ao passo que a manutenção do emprego é muito importante para sua formação. Não obstante, na hora de despedir o empregado, a empresa dispensa aquele que tem menos tempo de trabalho e, consequentemente, menos encargos. Ou seja, geralmente sobra para os mais novos de idade e de casa. É preciso encontrar uma política de emprego que prestigie o jovem. Talvez um incentivo fiscal... Na sua avaliação, cabe às empresas terceirizadas cumprir as obrigações trabalhistas? O Congresso nunca conseguiu disciplinar essa questão, porque há uma briga entre a empresa contratante e a tomadora de serviço. O grande problema não é a terceirização, mas a precarização do trabalho. Muitas terceirizadas pagam menos do que deveriam e não respeitam as normas de saúde, por exemplo. Quando a gente vê que o Ministério do Trabalho descobriu uma oficina de costura com operário sendo tratado como bicho, mas que trabalha numa empresa que presta serviço para uma grande loja, essa grande loja tem de ter responsabilidade, na medida que contratou uma outra que não era idônea. Não sou contra terceirizar, sou contra a ideia de que eu terceirizo e não é mais problema meu. “O primeiro juiz da causa é o advogado. Ele tem de orientar o cliente no caminho correto. Se o processo for conduzido de forma correta não tem o que ser discutido judicialmente”


Jornal420_site.pmd
To see the actual publication please follow the link above