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Excesso de dificuldades no processo 12 Sim DEBATE Antônio Carlos Berlini Advogado e presidente da Comissão de Direito à Adoção da OAB SP Um dos problemas que o Judiciário enfrenta para aplicar o Direito em relação à adoção resume-se na escassez de infraestrutura Cristóvão Bernardo sentimento comum quando nos deparamos com o processo de colocação em família substituta de criança ou adolescente que teve privado o seu direito de nascer, crescer e ser educado em uma família é o de que o processo de adoção seja complicado, burocrático, longo. Em princípio, é importante salientar que o direito à convivência familiar e comunitária de crianças e adolescentes é tida dentro do ordenamento constitucional brasileiro como prioridade absoluta. Daí derivam todos os demais direitos que tutelarão a vida destes pequenos até atingirem a sua maioridade. Quando este pequeno se vê privado deste sacrossanto direito de viver em família, é o Estado quem lhe tutela e tem a obrigação constitucional de lhe prover uma nova família que lhe eduque e lhe faça crescer em ambiente saudável e feliz. De sorte que se faz necessário diferenciar as diversas fases processuais pelas quais passa uma família e uma criança antes de serem chamadas de “família que se constituiu por adoção”, a família adotiva. Ritualmente, o processo é antecedido por outro no qual os pretendentes a pais adotivos são submetidos à avaliação e sob o crivo do Judiciário: o chamado processo de Habilitação à Adoção. Nesta fase, o pretendente se vê avaliado pelos serviços técnicos das Varas da Infância e da Juventude, que determinam se ele tem ou não condições de receber como filho uma criança nascida de outra família. É uma fase de preparação psicossocial e jurídica, obrigatória por lei para que se determine a real viabilidade e possibilidade de inserção da criança em um núcleo familiar. Uma vez habilitados, os pretendentes estarão inseridos no Cadastro Nacional de Adoção. Ainda, é necessário que os pais biológicos desta mesma criança tenham sido destituídos do poder familiar que exercem sobre ela. Então, o processo de adoção ainda é precedido do processo de destituição do poder familiar dos pais biológicos. É esta fase, talvez, a mais demorada e burocrática. É nela que o Estado Juiz analisa a real situação da família natural e a possibilidade de manutenção ou o retorno desta criança em seu núcleo familiar original. Não havendo a possibilidade de tal, de certo, o Poder Judiciário colocará tal criança à disposição dos pretendentes à adoção, anteriormente habilitados. É a terceira etapa pela qual passam os pretendentes, a mais simples e tranquila: o processo de adoção propriamente dito! É nesta etapa que o juiz analisará a convivência familiar entre o adotante e o adotado e a formação do vínculo afetivo entre as partes para, ao final, sentenciar-se em definitivo a colocação do infante no novo núcleo familiar. Analisadas as fases daquilo que comumente se chamou de processo de adoção, passa-se à seguinte reflexão: estes processos são realmente complicados e burocráticos a ponto de ensejar ilegalidades por parte dos pais pretendentes à adoção? Primeiramente, cumpre salientar que a adoção é um direito da criança. Isto posto, o sujeito de direito da relação jurídica “adoção” é a criança e não o adulto. As primeiras dificuldades enfrentadas partem dos adultos que pretendem dar um lar a uma criança e podem ser resumidas em uma frase: exigências do perfil da criança a ser adotada. Certo é que o pretendente deseja uma criança ideal e o mais próximo possível daquilo que imagina poder ser o seu filho, a ponto de – por vezes – se transformar em requisitos intransponíveis que se personalizam em uma criança. Podemos dizer que a primeira dificuldade advém, então, da parte dos próprios pretendentes à adoção que restringem por demais o perfil da criança desejada, havendo um abismo entre a criança ideal e a criança real. Outro ponto fundamental está em nosso ordenamento de Justiça. Um dos maiores problemas que nosso Judiciário tem enfrentado para aplicar o Direito em relação a estes pequenos abandonados se resume na sua própria escassez de infraestrutura. O Judiciário não dispõe de meios próprios e adequados para atender o direito à convivência familiar e comunitária dos 46.000 pequenos para adoção. E, embora tenhamos uma legislação infantojuvenil das mais avançadas do mundo, não somos ainda capazes de “fazer acontecer a lei”. Não nos faltam boas políticas públicas na área da infância e da juventude, não nos faltam boas leis. Nos falta, sim, capacidade de colocar em prática tais políticas. De certo, nossa legislação minorista recebe e necessita de reparos que, ao longo dos anos, vêm aprimorando o Estatuto da Criança e do Adolescente com as boas práticas dos operadores sociais e do Direito. Mas ainda não é o bastante.


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