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Confira a íntegra da entrevista no link: https://youtu.be/iA2O5aq_eus Rezek Supremo de que o presidente da mesa não lhe deu a palavra” 15 No seu tempo de magistrado não havia tanta exposição do STF como temos hoje. Essa visibilidade do Supremo deve-se a quê? O Supremo é o tribunal mais exposto que há no planeta. Lá fora, em toda parte, desde os tribunais internacionais aos tribunais domésticos de menor porte, todos se reúnem a portas fechadas. É verdade que o público tem acesso ao acórdão e aos votos, mas ninguém, nem mesmo os funcionários da casa, assiste ao debate, no qual pode se dar entreveros. Aqui não. Por força da Constituição já era assim. Mas a Constituição de 88 levou isso às últimas consequências, decretando que nenhuma sessão, de nenhum Tribunal, pode ser secreta, nem mesmo as administrativas. Quando o STF delibera sobre uma questão para saber se fulana de tal pode ou não se aposentar por tempo de serviço, tem de ser público. Isso faz com que o Tribunal seja intensamente imediatista, porque aí atua o fator humano e os seres humanos são imperfeitos. Dentre as imperfeições, talvez a vaidade não seja a mais grave, mas é uma realidade. A exposição de algumas manifestações que retratam a autoestima do juiz me parece menos grave. O mais grave é quando essa exposição leva ao conhecimento do público aquela outra vertente dos defeitos da criatura humana que é a luta, o entrevero. Todos os brasileiros têm visto, vez por outra, em diversos tribunais, mesmo no STF, algumas cenas de desentendimento de magistrados que todos prefeririam evitar. Os próprios envolvidos, assim que saem da sala, se arrependem profundamente. Isso não humaniza os juízes? Eu acho até que muitos dos críticos dos tribunais brasileiros, quando veem ali algum desentendimento um pouco mais ácido, reclamam, protestam contra isso, mas no fundo estão contentes. As pessoas, na realidade, se identificam com os juízes nessas horas pela sua humanidade. Por perceberem que ali há seres humanos. E ficam felizes por isso, embora se sintam no dever de dizer que estão profundamente envergonhadas daquele procedimento e a palavra formal seja sempre uma palavra crítica. A Operação Lava Jato ganharia essa dimensão se não existisse um processo bem articulado de divulgação das suas ações? Tudo isso tem a ver com o espírito da Constituição de 1988. É ela que não quer que as coisas sejam escondidas. E por força dela, o Ministério Público tem hoje grande empenho na sua transparência, em mostrar para a sociedade que sua atuação é correta. É isenta. Essa transparência é buscada na medida em que ela se põe como possibilidade, por obra da Justiça, do Ministério Público e da advocacia. A mídia vai com todo interesse a esse pote de informações da Lava Jato. É o resultado de um processo que tem a ver com o espírito SÃO PAULO da Constituição de 88 e com a noção pelas carreiras jurídicas, todas, de que é hora de mudar, de corrigir alguns defeitos de comportamento do nosso sistema, dos agentes do estado sobretudo, e de oferecer à sociedade brasileira alguma coisa mais crível, mais confiável e que acene com um futuro melhor. Como fica o advogado nessa redefinição dos papeis? O advogado é mais solicitado hoje do que nunca. A crise institucional interferiu positivamente na advocacia criminal que cresceu nos últimos anos. A importância do papel do advogado nesse cenário é flagrante. Muitas vezes se discutiu no passado esse tema: será que não estamos sendo colocados numa posição de relativa marginalidade em relação às outras carreiras? Os profissionais do Direito, em geral, foram valorizados pela Constituição de 1988. É a única neste mundo que fala no advogado como indispensável à administração da Justiça. Agora, deixando-se de lado o conjunto dos operadores do Direito e falando apenas na instituição judiciária, são vários os fatores que explicam essa explosão da presença do Poder Judiciário na realidade brasileira de hoje. É penoso, mas necessário, reconhecer que a principal causa do que está ocorrendo seja a crise de credibilidade dos poderes políticos. A classe política está no fundo do poço do descrédito. Assim, o terceiro poder, por eliminação que seja, sobe na cotação perante a sociedade. Há questões que os demais poderes levam à Justiça por causa de suas inabilidades, para a solução dos próprios problemas. O que se tem visto em matéria de travessia da Praça dos Três Poderes para ir buscar socorro no Supremo é inédito. Não acontece em lugar nenhum do mundo. Falta-me ver a hora em que um deputado ou senador vai atravessar aquela praça para se queixar no Supremo de que o presidente da mesa não lhe deu a palavra ou não levou a sério seu projeto de lei. A solução para remediar essa crise é a reforma política? É exatamente por isso que juristas veteranos, da maior respeitabilidade, programam nesse momento alguma coisa no sentido de convencer as pessoas e a classe política de que uma assembleia constituinte – chamada avulsa, ou não profissional – deveria se reunir e dar ao Brasil uma nova Constituição. Os próprios autores da ideia sabem que é muito difícil, porque dependeria de que a própria classe política reconhecesse suas deficiências políticas nesse momento. Não é uma questão de falta de qualidade, mas é uma questão de não serem os políticos de carreira aqueles de quem a sociedade brasileira esperaria uma Constituição durável. Podemos, de qualquer maneira, com a Constituição que temos, fazer uma bonita reforma política e uma reforma eleitoral. A reforma política é, sobretudo, o novo trabalho do Direito Eleitoral brasileiro, que é um dos setores mais deficientes da nossa ordem Jornal do Advogado – Ano XLII – nº 424 – Fevereiro de 2017 jurídica. O Direito Eleitoral brasileiro é uma colcha de retalhos, é uma sucessão de remendos. Não há coerência. Não se pode cogitar de reforma do Direito Eleitoral sem a reforma política do seu conjunto. O que o advogado Francisco Rezek escolheria para regime no Brasil? Prefiro o sistema presidencial, sobretudo pela posição em que ele coloca o Poder Judiciário. Sempre fui favorável à preservação daquilo que foi o nosso modelo: a República Federal Presidencialista que, cem anos depois da guerra da independência dos Estados Unidos, os fundadores da nossa república resolveram adotar. Nenhum dos nossos problemas, nenhuma de nossas crises, tem a ver com a natureza do sistema presidencialista de governo. Tenho certeza de que estaríamos hoje enfrentando uma crise mais grave se o nosso sistema de governo fosse parlamentar. A saída para o Brasil está em 2018? É difícil ter grandes ilusões. Eu não tenho lembranças de alguém, que nas últimas eleições, tenha ido ao palanque garantir que, se eleito, será um dos ativistas da reforma política. É como se falássemos línguas diferentes. É como se eles achassem que os votos que conseguem amealhar com o discurso da reforma política fossem poucos, como se fosse mais lucrativo do ponto de vista das urnas prometer coisas que tenham algum apelo demagógico qualquer. No cenário internacional, qual sua opinião sobre o governo Trump? Iludem-se aqueles que acham que o discurso radical de Trump não é suscetível de ser efetivado, porque ele depende do Congresso, e no Congresso, apesar da maioria republicana, são muitas as cabeças pensantes que não aceitariam isso. Então, ele pode falar, mas ele não fará. Enganam-se essas pessoas. O sistema constitucional norte-americano permite que o presidente faça uma porção de loucuras da sua própria cabeça, sem necessidade de aprovação do Congresso. Sobretudo no domínio da fronteira, dos direitos humanos, em vários dos seus aspectos, como no domínio das relações internacionais. É enorme o poder que o presidente dos Estados Unidos tem para, da sua própria cabeça, sem nenhum apoio parlamentar, romper alianças, trair promessas feitas a outros países que estão ali na expectativa de que aquele tratado seja honrado e venha viger em benefícios de todos. E não deu outra. Nos dias seguintes e até hoje, a cada hora, ele faz uma coisa que não podemos dizer que é surpresa porque ele anunciou tudo. A ameaça de Trump à raça humana e, com uma amplitude ilimitada, essa sim é uma coisa séria. “Falta-me ver a hora em que um deputado ou senador vai atravessar a Praça dos Três Poderes para se queixar no


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