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DEBATE AMPLIAR PRAZO DE SUSPENSÃO A INFRATOR QUE EXTRAPOLAR Luciano Anderson de Souza Vote sobre o tema na versão on-line: http://www.oabsp.org.br/jornal José Luís da Conceição Advogado criminalista e professor da Faculdade de Direito da USP Uma medida que abstrai da solução penal em prol da administrativa desvela-se meritória no sentido de tutelar o trânsito de modo adequado 12 Sim da ofensividade chegam ao limite de aplicabilidade, pois, embora não se impeça o legislador de proteger interesses em estágios iniciais de perigo quando for suficientemente identificável a relação entre ambos, deve-se ter cautela na análise crítica de propostas de criminalização de ações que constituam meros atos preparatórios ou carentes de ofensividade. A exclusiva desvaloração da ação, sem consideração prévia e posterior sobre a criação de uma situação apta a potencialmente afetar um interesse humano palpável, afigura-se como de questionável validade. Como emblemáticos casos temos os crimes de “fuga do local do acidente” e “embriaguez ao volante”, envoltos em dificuldades de justificação, apesar da parca discussão judicial. Vê-se que a lei, vulnerando a dogmática por meio da consagração de uma política de repressão a qualquer preço, o que inclui também a abstração de outros meios de regulação, como o administrativo, ou outros mecanismos sociais, como a educação no trânsito ou o melhor treinamento dos agentes públicos, revelou, até agora, a predileção pelo caminho penal. Isso culmina em pouca eficácia e ilegítimo aumento do arbítrio estatal. Esse quadro tem gerado, ademais, posturas como de interpretações forçadas de elemento subjetivo doloso em casos de mortes no trânsito perpetradas por pessoas tidas por embriagadas, como se a mera ingestão de álcool descaracterizasse a culpa, olvidando-se da afirmação de Baleeiro em julgamento do STF, em 1969, no sentido de que a simples embriaguez, por si só, não caracteriza o dolo eventual. Nesse sentido, uma medida que abstrai da solução penal em prol da administrativa desvela-se meritória no sentido de tutelar o trânsito de modo adequado. A suspensão não é automática e cabe recurso. Em 2017, mais de 400.000 motoristas tiveram a habilitação suspensa no Estado, o que sinaliza, mormente considerando-se que a fiscalização é falha, que o quadro é problemático, devendo haver intervenção. É claro que a singela regra possui alcance limitado, devendo haver outros focos. De qualquer forma, mais apropriado que a exasperação penal. resposta ao questionamento da razoabilidade da medida enseja uma reflexão que perpassa, para além de um limitado olhar da problemática social de trânsito em face do Direito Administrativo, também por sua consideração em confronto com a utilização desenfreada e atécnica por parte do legislador e autoridades do ramo penal nesta seara. A ponderação há de partir do marco legislativo atual, qual seja, a Lei nº 9.503/1997, que instituiu novo Código de Trânsito. Referido regramento cuida, além de disposições de natureza administrativa, também de penais e processuais. Quer sob o aspecto administrativo, quer sob o jurídico-penal, a lei revela influxo expansivo recrudescedor, o qual atendeu ao discurso midiático de busca por reagir de modo implacável à suposta impunidade em face de condutas indesejadas no tráfego. No entanto, conforme Paulo J. da Costa Jr., no afã de apresentar uma legislação capaz de coibir infrações de trânsito, inúmeros princípios foram ofendidos. Dessa maneira, pode-se compreender essa legislação como reveladora dos característicos do expansionismo penal da sociedade pós-industrial. Isso significa que ela revela caráter antecipatório criminal, procurando conformar comportamentos de conteúdo típico de alçada administrativa, mediante construções penais porosas como são aquelas típicas da sociedade do risco: de perigo abstrato, normas penais em branco, tipos culposos e abertos. Isso revela o fenômeno da administrativização do direito penal, criticado, dentre outros, por Miguel Reale Jr. O perigo abstrato é paradigmático. Como sabido, crime de perigo presumido é aquele em que o perigo não precisa ser comprovado, sendo suficiente a simples realização da conduta vedada. Atendendo à ideia de contenção de riscos, as legislações abusam da fórmula, com vistas a que não se afigure sequer a possibilidade de lesão a certos interesses. Como nota Ana Elisa Bechara, é justamente em relação a tais delitos que a teoria do bem jurídico e o princípio


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