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Especialistas debatem ética empresarial e concorrência Devedores contumazes, que burlam o sistema para não pagar impostos, e valorização dos bons contribuintes pautaram painel na Conferência 22 EMPRESARIAL A realidade das empresas brasileiras, a carga tributária, a legislação e a fiscalização pelos órgãos de controle foram relacionados no evento especial sobre “Concorrência e Ética Empresarial”, na XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira. Presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO) e membro da Comissão de Combate à Pirataria da OAB SP, Edson Luiz Vismona comandou a mesa de debates com participação do vice-presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), José Ricardo Roriz Coelho, enquanto debatedor. O juiz federal do Tribunal Regional Federal – 3ª Região (TRF 3) e membro consultor da Comissão de Cooperativismo da OAB SP, Renato Lopes Becho, apresentou a realidade vivenciada na Vara de Execuções Fiscais e explicou o que significa devedor contumaz. “O que caracteriza o devedor contumaz é a utilização de mecanismos para não pagar nenhum tributo. Este abre uma empresa e realiza uma série de declarações tributárias em um determinado endereço, depois muda a sede para outro domicílio fiscal. E, como a administração tributária é falha na checagem desses dados, o devedor utiliza desta prática reiteradamente; com isso, consegue não pagar tributo”, ressaltou. Para Becho, o maior problema é a falta de diálogo dos administradores de tributos com os advogados, e é preciso que o juiz oficie ao procurador regional chefe da Fazenda Nacional. “A litigiosidade tributária no Brasil existe porque a administração tributária não confia no contribuinte e não oferece mecanismos diretos de conversa. A Fazenda Nacional não dialoga com a Receita Federal. É um sistema em que o advogado não conversa com o cliente. O procurador requer nos autos para que o juiz federal oficie à Receita para colher informação e colocar nos autos. Estamos falando também de um grande desperdício de dinheiro na execução fiscal, de uma ineficiência brutal. Em 2011, um processo federal de execução fiscal custava R$ 4.368 e, muitas vezes, não se cobre esse valor com os débitos cobrados”, observou. Professor de Direito Tributário, Hamilton Dias de Souza esclareceu que é preciso diferenciar os devedores entre eventuais, reiterados e contumazes. “O eventual é aquele que simplesmente tem dificuldade de caixa e não paga tributo, não pode ser alcançado por medidas restritivas e deve ser protegido pela constitucionalidade. O reiterado deixa de pagar tributo por espaço de tempo grande e reduz suas margens e preço, o que interfere na concorrência e no mercado, não merece a mesma proteção do eventual, mas não é caso de cassar ou suspender inscrição estadual. Essa prática deve ser coibida com fiscalização constante. E o contumaz é o que se organiza com este objetivo e cria todo um sistema, já sabidamente por ele que não irá pagar tributos. Quem assim faz comete ato ilícito, esse devedor está fora do sistema, não merece proteção constitucional”, diferenciou. Os devedores contumazes criam empresas de duração temporária, com patrimônio reduzido para se aproveitar de decisões judiciais únicas, suspendendo o recolhimento de tributos. O secretário-adjunto da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, Rogério Ceron, apresentou o programa de conformidade fiscal (PLC 25/2017) do governo do Estado, que está em trâmite na Assembleia Legislativa. De acordo com ele, o objetivo do programa é valorizar os bons contribuintes com a segmentação por perfil de risco, fomento à autorregularização, orientação e divulgação dos dados para maior transparência. “A sociedade tem o direito de saber quem são os devedores contumazes”, disse. O consultor e ex-secretário adjunto substituto da Receita Federal, Ricardo Pinheiro, tratou sobre o controle fiscal como mecanismo de combater a concorrência desleal e ponderou que a evolução da tecnologia de informação para coleta de dados não simplificou a questão tributária no país devido à falta de integração dos sistemas entre União, estados e municípios. “A administração tributária sabe quem é o devedor contumaz, ele sempre vai ser um cara rico, dono de uma empresa falida porque não paga imposto. É preciso identificar e fechar estas empresas, mas responsabilizando a pessoa que está por trás, senão ele vai abrir outra empresa. Mais relevante que a carga tributária em si é que todos paguem a mesma coisa, pois pesa mais no bolso do contribuinte pagar o imposto pelos outros. É preciso segurança jurídica e uma fiscalização bem instrumentalizada. E é preciso debater esse monstro que se coloca de normas na Constituição Federal em matéria tributária, se for para começar a falar de simplificação, porque isso engessa o Direito Tributário”, considerou. O procurador do Estado de São Paulo, Alexandre Aboud, que integra o Grupo de Atuação Especial para Recuperação Fiscal (Gaerfis), pontuou que o modelo tradicional é insuficiente e que é preciso pensar em uma atuação institucional que seja proativa no combate à sonegação fiscal, integrada e coordenada entre várias instituições, além do investimento em tecnologia da informação. “O que facilita essa atuação formalizada é que os agentes passam a ter um acesso a uma base de dados ampliada e um dos princípios de administração é o de que várias mentes pensam melhor que uma sozinha. Hoje, com esses mecanismos dessa base de dados ampla, é possível por meio de fontes abertas e fechadas facilitar a identificação de grupos econômicos”, elucidou. Entre os elementos indiciários de interposição fraudulenta apresentados pelo procurador, constam: mudança de endereço, queda brusca de faturamento, empresa sem site, transferência de bens entre funcionários, e outros. “Se o custo de execução fiscal em 2011 era de cerca de R$ 4 mil, atualmente é de R$ 6.600,00. O Estado de São Paulo ajuíza ações apenas acima de 600 Unidades de Padrão Fiscal (UPFs). O resto é protestado. É preciso diminuir o número de processos, cada procurador tem 30 mil processos, isso é impossível de trabalhar. Precisamos criar a filosofia de limpeza desse lixo judiciário e atuar bastante nos casos que tratam com devedor contumaz e nos casos em que se discute tese”, afirmou. Cristóvão Bernardo SEM CONVERSA: De acordo com Renato Lopes Becho (à dir.), a litigiosidade tributária no Brasil existe porque a administração não confia no contribuinte


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