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DEBATE O BRASIL DEVE EDITAR LEI ESPECÍFICA PARA Cristóvão Bernardo Gustavo Henrique Badaró Vote sobre o tema na versão on-line: http://www.oabsp.org.br/jornal Advogado criminal e professor de Direito Penal da Faculdade de Direito da USP A facilidade da replicação de notícias falsas tem incontrolável potencial expansivo da informação, capaz de gerar graves e irreparáveis danos 12 Sim tema das notícias falsas, principalmente veiculadas pela rede mundial de computadores, tem sido objeto de intensos debates, diante da proximidade das eleições de 2018. Juridicamente, a ideia de estabelecer qualquer limite legal é sensível pois influencia valores e direitos relevantes, como a liberdade de expressão, o acesso à informação, a lisura do processo eleitoral, a honra das pessoas etc. Criminalizar não é uma solução mágica nem resolverá todo problema. A tutela penal se justifica se não for possível obter adequada proteção por outros campos do Direito. Além disso, é evidente que o tipo penal deve ser elaborado com boa técnica legislativa e, como adverte Antolisei, em “Manuale di Diritto Penale”, os crimes contra a fé pública são a matéria mais complexa, delicada e árdua da parte especial do Direito Penal. Primeiro, é necessário distinguir fatos falsos veiculados por um cidadão, de um lado, e de meios de comunicação, ainda que informais, de outro. Embora reprovável eticamente, o cidadão não tem, em regra, um dever jurídico de dizer a verdade, quando elabora um documento ou quando emite uma declaração. Excepcionalmente, a lei impõe ao particular o dever de somente fazer declarações verdadeiras, cuja violação poderá caracterizar o crime de falsidade ideológica. Ao mais, se a notícia falsa ofender a honra de alguém, os crimes de calúnia, difamação e injúria são aplicáveis tranquilamente aos atos praticados no ambiente virtual. Fora disto, não deve haver crime. Se eu publicar, numa rede social, que “por motivo de luto, não irei dar aula hoje”, sem que ninguém próximo a mim tenha falecido, terei divulgado fato falso, mas não será crime. E não deve ser. Diverso deve ser o regime das notícias em meios de comunicação. Bons jornais e revistas que investem em repórteres qualificados, na verificação da informação antes de publicá-la, na qualidade das fontes jornalísticas, terão boa credibilidade perante o leitor. Há, também, meios de comunicação que, por sua linha editorial ou até mesmo por restrições econômicas, não têm o mesmo rigor de verificação da veracidade da notícia. Para ambos, a atuação do Direito não é necessária. A previsão de direito de resposta, a reparação civil e, principalmente, o abalo da reputação e a perda de leitores serão suficientes para reagir às notícias falsas. Há, por outro lado, uma pseudo-imprensa, com sedizentes jornalistas que trabalham a soldo, vendendo a publicação de fatos sabidamente falsos, como se notícia fosse. Em tempos de jornais impressos, o potencial de tais informações era diminuto. Com a internet, o cenário é outro. A facilidade da replicação de notícias falsas tem um efeito instantâneo e um incontrolável potencial expansivo da informação, capaz de gerar graves e muitas vezes irreparáveis danos. Além disso, muitos desses meios de informação não têm claramente identificado quem são os responsáveis por seus conteúdos, não dependem de parques gráficos e podem estar formalmente registrados em países pouco ou nada acessíveis em termos de cooperação jurídica internacional. Para esses enganadores da fé pública, meras tutelas judiciais ressarcitórias ou inibitórias serão insuficientes. Uma sanção pecuniária, ou uma ordem judicial de retirada da rede mundial será praticamente inócua. No máximo, o “quadrilheiro da pena”, na expressão de Ruy Barbosa, criará de outra página, no dia seguinte, e continuará a divulgar a mentira. Ainda que com dificuldades probatórias para investigar, processar e punir quem elaborou ou disseminou tal notícia falsa, a tutela penal, em tal caso, é necessária, devendo ser cuidadosamente elaborado um tipo penal que puna a conduta de publicar ou divulgar na rede mundial de computadores, notícia falsa que provoque perturbação social, em hipóteses a serem definidas estritamente pelo legislador como, por exemplo, no processo eleitoral.


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