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9 LEGISLAÇÃO Nove artigos passaram a integrar a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) – ordenamento jurídico de 1942 – no final do mês de abril, quando a Presidência da República sancionou a Lei nº 13.655/2018. Polêmico, o acréscimo à legislação divide opiniões de advogados que integram comissões da OAB SP. Se por um lado há a leitura de que o texto trará maior segurança jurídica, por outro restam críticas, entre elas, a de extrapolação de competências da atividade de quem tem em mãos o poder de decisão. Em linhas gerais, o objetivo do novo pacote de normas é estabelecer que as esferas administrativas (órgãos da administração direta) e de controle (tribunais de contas, por exemplo), além do Judiciário, não decidam com base em “valores jurídicos abstratos”, sem que as consequências práticas da decisão sejam consideradas. As decisões deverão considerar obstáculos e dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo. “Não é incomum nos dias de hoje que o gestor público cumpra todas as regras e mesmo assim receba condenação por força de interpretação de conceitos genéricos”, diz Adib Kassouf Sad, presidente da Comissão de Direito Administrativo. O advogado também integra a Comissão de Controle Social dos Gastos Públicos. “Era necessário fazer coincidir a lei e a interpretação.” Para ele, o Direito “passou a ser, em muitos casos, o que estava na cabeça do intérprete”, violentando a própria legislação. Em suma, na avaliação do especialista, os novos artigos vão contribuir para a segurança jurídica. Há visões divergentes. Associações representativas de magistrados, auditores e do Ministério Público chegaram a pedir veto integral da proposta ao presidente Michel Temer. O artigo 20 foi um dos alvos de polêmica. O texto refere-se à abstenção de justificar decisões com base em ‘valores jurídicos abstratos’ e essas entidades consideraram preocupante o subjetivismo do próprio termo. Enquanto isso, para os simpatizantes do conteúdo de novas regras, o trecho refere-se ao fato de haver interpretação com base em conceitos genéricos, conforme cita Sad. Somados ao artigo 20, os dispositivos seguintes, 21 e 22, formam um conjunto de regras que determinam aos tomadores de decisões justificá-las, considerando os efeitos práticos para tal: será avaliar as circunstâncias, indicar as consequências e considerar obstáculos e dificuldades reais do gestor para, então, poder determinar sentença. Em parecer divulgado em meados de abril deste ano, 13 juristas avaliaram favoravelmente as alterações à LINDB. Para os professores de universidades de Direito, o dispositivo veda motivações decisórias Jornal do Advogado – Ano XLIII – nº 438 – Maio de 2018 SÃO PAULO Sancionada, Lindb ainda divide opiniões retóricas ou principiológicas, sem análise prévia de fatos e de impactos. “Obriga o julgador a avaliar, na motivação, a partir de elementos idôneos coligidos no processo administrativo, judicial ou de controle, as consequências práticas de sua decisão”, diz o documento. Ainda para os juristas, o novo pacote de regras “(...) dá passo importante ao pretender transpor para norma geral parâmetros de interpretação e aplicação do Direito Público bastante consensuais, que na prática já vêm sendo observados e adotados no cotidiano das esferas administrativa, controladora e judicial, porém de forma fragmentada, assistemática”. A necessidade de avaliar contextos como o de consequências práticas da decisão é um dos pontos que recebe crítica de José Nuzzi Neto, secretário-geral da Comissão de Controle Social de Gastos Públicos. “Discordo do que se propõe porque será praticamente transformar a atividade judicial, ou de quem decide na esfera administrativa, que é a de ponderar a situação, na de administrador em si”, avalia. “Em suma, para considerar consequências práticas da decisão, os juízes ou o Tribunal de Contas terão de se colocar no papel de administradores. A meu ver extrapola o campo de atividade de profissionais do Direito”, comenta. Mais um trecho que causou críticas de agentes do Direito foi parte do artigo 28. Recentemente, o advogado Carlos Alberto Expedito de Britto Neto, vice-presidente da Comissão de Controle Social dos Gastos Públicos, havia comentado que o trecho, se fosse aprovado, amenizaria responsabilidades do administrador público. No entanto, a Presidência da República vetou a parte considerada problemática pelos críticos. “Concordo com o espírito do que restou no artigo 28. Da forma como antes estava apresentado, veríamos retrocesso em tudo o que se alcançou por meio de órgãos de fiscalização”, diz Neto. O artigo 28 atribui responsabilidade pessoal ao agente público em caso de dolo ou erro grosseiro. Essa responsabilidade não retira a do Estado por atos de seus agentes, conforme prevê o artigo 37 da Constituição Federal. Com este aspecto, Nuzzi concorda: “É uma regra que considero razoável”. “Mas a pergunta que cabe é se está no lugar certo do ordenamento jurídico. Há uma Lei de Improbidade Administrativa, que não tem essa regra específica e soma um conjunto de normas demasiadamente abertas”, avalia. Tramitação A nova parte sancionada da LINDB caminhou como projeto de lei originado no Senado Federal a partir de 2015 (PLS 349/15), renomeado posteriormente para PL 7448/17. Para Nuzzi, a aprovação não deveria ter ocorrido por meio de regime diferenciado – ou seja, sem votação em plenário. Ele diz que o projeto foi votado apenas em comissões das duas Casas do Congresso Nacional. “Foi usada uma possibilidade que a Constituição permite. Mas em minha opinião uma lei destinada a mexer tanto com a vida jurídica do país deveria ter sido debatida em plenário”. Para ele, inclusive, essas regras não deveriam ter sido inclusas na LINDB, mas no Código de Processo Civil e ou também no Estatuto da Magistratura. “Se constam dessa legislação, podem até não ser necessariamente seguidas”, comenta. Os especialistas em Direito que assinaram o parecer citado acima sintetizaram, no documento, que durante os quatro anos de trâmite, o debate do projeto teve apoio de juristas, economistas, administradores públicos e formadores de opinião.


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