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DEBATE INTERROGATÓRIO POR VIDEOCONFERÊNCIA 12 Vote aqui sobre o tema em discussão ara quem não atua no direito criminal, pode parecer descabida a resistência que o interrogatório por videoconferência ainda enfrenta entre os advogados da área. Afinal, argumentam, tal procedimento já é utilizado, com sucesso, por vários países do mundo, desde meados da década de 1980. Mesmo no Brasil, a tecnologia não é nova. O primeiro interrogatório por videoconferência foi realizado em 1996, ainda que não houvesse qualquer regulamentação a respeito. As primeiras leis sobre o assunto – estaduais – foram promulgadas, em São Paulo e no Rio de Janeiro, apenas em 2005. Durante esse período, o Superior Tribunal de Justiça decidiu pela validade dos atos, por ausência de demonstração concreta de prejuízo para o acusado. No entanto, o interrogatório por videoconferência permaneceu objeto de intensas discussões doutrinárias Sozinho no presídio, muitas vezes algemado, é impossível garantir que o réu não sofra qualquer espécie de pressão física ou psicológica e jurisprudenciais: a celeridade da instrução versus o direito do réu de estar presente fisicamente perante o juiz. Em 2008, o Supremo Tribunal Federal se manifestou sobre o tema, declarando as citadas leis inconstitucionais, nos termos do artigo 22 da Constituição Federal (segundo o qual compete privativamente à União legislar sobre direito processual). No ano seguinte, a matéria foi finalmente disciplinada em âmbito federal. A Lei nº 11.900 adicionou nove parágrafos ao artigo 185 do Código de Processo Penal, regulamentando a possibilidade de realização do interrogatório do réu preso “por sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real”. De acordo com o texto legal, a realização de qualquer ato processual pelo sistema de videoconferência só poderá ser determinada “excepcionalmente”, por “decisão fundamentada”, e “desde que a medida seja necessária para atender” uma das finalidades previstas, de forma taxativa, em seus incisos: prevenir risco à segurança pública, quando houver, por exemplo, fundado receio de fuga; em razão de enfermidade; coação à vítima ou testemunha; ou responder à gravíssima questão de ordem pública. A excepcionalidade da medida demonstra cabalmente que a presença física do acusado perante o juiz é importante para a formação de sua convicção. A tela de um computador, segundo o desembargador Guilherme de Souza Nucci, “jamais irá suprir o contato direto que o magistrado deve ter com o réu, até mesmo para constatar se ele se encontra em perfeitas condições físicas e mentais”. No entanto, na prática, a determinação de interrogatório por videoconferência raramente é justificada. Quando é, o argumento utilizado é genérico, como a possibilidade de fuga. Mas sabemos que os reais motivos não têm nada de excepcionais. Pelo contrário, são problemas crônicos e absolutamente comuns no âmbito administrativo: indisponibilidade de viaturas para transporte do réu, número insuficiente de agentes para sua escolta, custo operacional, dentre outros. Da mesma forma, as garantias previstas no artigo 185 do CPP, embasadoras da lisura do ato e do exercício do contraditório e da ampla defesa, também são dificilmente cumpridas. O parágrafo 5º, por exemplo, assegura ao réu a presença de pelo menos dois defensores – aquele que deverá estar presente na sala de audiência do Fórum e o que estará no presídio em sua companhia – além de canal telefônico reservado entre eles. Não é necessário militar na área, entretanto, para saber que isso não ocorre. O advogado, por mais combativo que seja, não detém o dom da ubiquidade. Sozinho no presídio, muitas vezes algemado, é impossível garantir que o réu não sofra qualquer espécie de pressão física e psicológica, maculando a autodefesa. O precário canal telefônico que se tem experimentado também não se equipara ao contato pessoal do preso com seu defensor. É preciso, portanto, que o recurso tecnológico seja usado com parcimônia, reservando-o aos casos absolutamente excepcionais. Fernando Castelo Branco Advogado, é professor de Direito Processual Penal da PUC-SP Sim Cristovão Bernardo


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