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Jornal do Advogado – Ano XLIV – nº 441 – Agosto de 2018 SÃO PAULO SOCIAIS PODEM CERCEAR A LIBERDADE DE EXPRESSÃO? Advogada, presidente da Comissão de Educação Digital da OAB SP Nenhuma liberdade individual é absoluta. Há, todavia, limites morais, éticos e jurídicos 13 Não Cristina Sleiman José Luís da Conceição m que pese vivermos em um Estado Democrático de Direito, no qual se garante a liberdade de expressão e veiculação de informações de forma livre, por certo que todo indivíduo defende seus ideais, bem como suas convicções. No entanto, tais garantias não podem servir de alicerce para práticas ilícitas e ofensivas. Cabe lembrar que a Constituição Federal, apesar de garantir o direito à liberdade de expressão no art. 5º, sabiamente veda o anonimato e resguarda, em seu inciso X, os chamados direitos personalíssimos (imagem, honra, intimidade e privacidade). A vedação ao anonimato tem por objetivo garantir que o indivíduo seja identificado para que, em caso de extrapolar o seu direito, possa então ser devidamente responsabilizado. A livre manifestação do pensamento deve se dar entre balizas minimamente seguras, sem que haja, portanto, abuso de direito, sendo que a harmonização entre as garantias constitucionais é imprescindível para a prevenção a abusos. É de conhecimento comum que as mídias sociais têm um poder de influência sobre o ser humano, gerando polêmicas e, muitas vezes, conflitos desnecessários, devido a posicionamentos e opiniões inconsistentes que extrapolam os limites impostos pela própria sociedade, podendo ocorrer de forma proposital ou por mero descuido ou desconhecimento da lei, quando se trata de um indivíduo que não atua no âmbito jurídico. Diante de um cenário geral, aplicado a todo e qualquer cidadão, passamos a pontuar de forma não exaustiva, mas com apenas uma pitada para esta calorosa discussão, sobre dispositivos aplicados especificamente aos magistrados, além dos já mencionados. A Lei Orgânica da Magistratura dispõe, entre outras questões, sobre os deveres dos magistrados, sendo um deles o disposto no art. 35, VIII, que determina “manter conduta irrepreensível na vida pública e particular”. No art. 36, III, há vedação para manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério. O art. 41 dispõe sobre a manifestação de opinião que apresenta como exceção a responsabilização do magistrado apenas em caso de ocorrência de impropriedade ou excesso de linguagem. Assim como a classe dos advogados possui um órgão regulador, devendo obediência ao Código de Ética, os profissionais da magistratura também devem seguir o Código de Ética dos Magistrados, publicado em 2008, portanto, dez anos atrás. O Código de Ética preceitua que é essencial cultivar princípios éticos, pois cabe ao magistrado também a função educativa e exemplar de cidadania em face dos demais grupos sociais. Além disso, veda ao magistrado “procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções” e comete-lhe o dever de “manter conduta irrepreensível na vida pública e particular” (LC nº 35/79, arts. 35, inciso VIII, e 56, inciso II). O Código menciona princípios da independência, imparcialidade, do conhecimento e capacitação, da cortesia, transparência, do segredo profissional, da prudência, diligência, integridade profissional e pessoal, da dignidade, honra e do decoro. O art. 3º dispõe que a atividade judicial deve desenvolver-se de modo a garantir e fomentar a dignidade da pessoa humana, objetivando assegurar e promover a solidariedade e a justiça na relação entre as pessoas. Todos os dispositivos acima demonstram a seriedade e responsabilidade para com a sociedade, também em posição de cortesia, respeito e exemplo. Infelizmente, presenciamos um momento social tenso, fomentado, muitas vezes, por ódio e intolerância, independente do meio em que cada um vive, de sua classe social, profissão ou cargo. Em recente Provimento (nº 71 de 14/06/2018), considerando a significativa quantidade de incidentes envolvendo magistrados em redes sociais, houve determinação específica do CNJ contrária a manifestações em tais canais de comunicação, especificamente para algumas situações que, no meu entendimento, por si só seriam infrações a dispositivos já vigentes, seja na Constituição Federal ou no Código de Ética, por exemplo. Afinal, calúnia, injúria, difamação, ameaça e discriminação são práticas ilícitas, e cabe a todos nós sermos exemplos de cortesia e respeito. Por fim, não há o que se falar em cerceamento de direito, mas sim em “liberdade com responsabilidade”.


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