“Nosso maior desafio, não obstante, é manter a segurança
jurídica em face de um mundo cada vez mais hiperconectado,
onde os conflitos e as mudanças se sucedem de forma acelerada”
O senhor afirma que o Brasil passou por cinco anos
difíceis, após as manifestações de 2013, e manteve
a democracia funcionando. O que possibilitou essa
conquista?
O principal fator é que estamos há 30 anos sob a égide
da mesma Constituição, responsável pela estabilidade
da democracia brasileira. Somado a isso, temos um
Judiciário fortalecido, independente e atuante, que
cumpre sua função de garantir a autoridade do Direito
e da Constituição. Em meio à constante transformação
do mundo, cabe à Constituição a manutenção do
equilíbrio. Como guardião da Constituição, o STF segue
com sua missão de moderar os eventuais conflitos
sociais, políticos e econômicos, assegurando, assim,
a paz social, função última da Justiça.
Em recente sessão no CNJ, o senhor ponderou que
magistrado não pode ter desejo e que a classe deve
se manter isenta. Atuar dentro das competências e
manter a imparcialidade é possível no Supremo, um
tribunal constitucional que assume papel político
como guardião da Constituição?
O Supremo é o guardião da Constituição em sua
totalidade, em todos os seus aspectos e finalidades.
Quando há uma manifestação por parte do STF que
envolve uma questão dita “política”, é porque algum
comando constitucional foi atacado. Reforce-se que o
Supremo sempre atuará segundo suas competências
e com imparcialidade, observando a legalidade e a
constitucionalidade.
Chegou a comentar que questões mais polêmicas,
como a revisão da condenação em segunda instância,
seriam postas em pauta em 2019. O tema será
avaliado ainda no primeiro semestre?
Esse tema será colocado em pauta em 2019. Após
conversa com o relator e havendo consenso entre os
ministros, o caso será incluído em pauta.
A publicação antecipada da pauta de julgamentos
no plenário do STF vai continuar em 2019? Quais
resultados já verificou com essa prática em 2018?
Essa é uma diretriz que vai perdurar por toda minha
gestão. Inclusive, pretendemos liberar, ainda este
ano, toda a pauta do primeiro semestre de 2019. O
resultado maior é a transparência e a prestação de um
serviço adequado para todos que integram o sistema
de Justiça ou que acionam o STF. Algumas liminares
podem acabar entrando, de última hora, na pauta, por
conta da natureza da ação, especialmente aquelas do
controle concentrado, como foi o caso da Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº
548, sobre a livre manifestação de ideias em universidades.
Assuntos como esse demandam uma resposta
rápida do Judiciário.
Por que a segurança jurídica é o grande desafio do
Poder Judiciário no século XXI?
A partir da segurança jurídica, conseguimos oferecer
estabilidade ao país. Os tribunais brasileiros,
notadamente o STF e o Superior Tribunal de Justiça,
são responsáveis pela pacificação das questões que
chegam ao Judiciário, prolatando decisões que são
seguidas pelas instâncias inferiores. Precisamos de
segurança jurídica e de legitimidade para alcançarmos
mais eficiência e transparência, de modo que
correspondamos à sociedade naquilo que é de nossa
responsabilidade. Nosso maior desafio, não obstante,
é manter a segurança jurídica em face de um mundo
cada vez mais hiperconectado, onde os conflitos e as
mudanças se sucedem de forma acelerada.
Como forma de enfrentar essa questão, o senhor
defende a aplicação de inteligência artificial no
Judiciário. De que maneira essa tecnologia deve
ser empregada?
A utilização de sistemas de inteligência artificial surge
como uma das principais possibilidades de superarmos
os gargalos que existem na tramitação de processos
perante o Judiciário. O emprego da tecnologia deve ser
feito de forma a otimizar o trabalho do juiz e a garantir
a realização do princípio constitucional da razoável
duração do processo. O volume das demandas que
chegam diariamente ao Judiciário exige que sua agenda
tenha a inovação como elemento-chave para oferecer
aos jurisdicionados uma resposta adequada e rápida.
Quais as principais diretrizes de sua gestão à frente
do STF para os próximos dois anos?
Além das diretrizes já elencadas, temos como prioridade
o diálogo com os Poderes; a parceria com a
Defensoria Pública para responder às cartas relativas
a detentos recebidas pelo STF; a criação de instrumentos
de fiscalização e de cobrança de previsibilidade e
coerência das decisões judiciais; a democratização da
linguagem jurídica e a modernização da programação
Diias Toffffollii
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Jornal do Advogado – Ano XLIV – nº 443 – Outubro de 2018
SÃO PAULO
da Rádio e da TV Justiça, de modo a melhor servir à
cidadania, com produção de conteúdo com foco nos
direitos, garantias e liberdades dos cidadãos. Com relação
à repercussão geral, destaco a análise prévia pela
presidência de recursos extraordinários com agravo
(ARE); a análise prévia pela presidência de processos
representativos de controvérsia indicados pelos tribunais;
o reexame dos temas que devem ser mantidos
em repercussão geral e a priorização do julgamento de
processos com repercussão geral reconhecida. No que
tange à gestão processual, propomos a organização
da pauta de julgamentos do Plenário físico tendo em
vista a conclusão dos processos com vista devolvida
e os referendos de liminares; a adoção de sistema
eletrônico restrito de disponibilização antecipada de
votos dos ministros; o uso de inteligência artificial na
triagem de processos e a expansão disso aos demais
tribunais; a atualização do Regimento Interno do STF;
a ampliação do Plenário Virtual e a divulgação de calendário
semestral de julgamentos do Plenário.
E do CNJ?
Atuação com o Conselho Nacional do Ministério Público,
com o Conselho da Justiça Federal, com o Conselho
Superior da Justiça do Trabalho e com as escolas de
formação da magistratura nacional; individualização
e identificação biométrica de detentos, a partir de
parceria com o Tribunal Superior Eleitoral; expansão
do Sistema Eletrônico de Execução Unificado (SEEU)
para todas as varas de execução penal do país; garantia
dos direitos dos presidiários, como a emissão de documentos;
retomada do programa Começar de Novo,
que busca dar oportunidades de estudo e trabalho a
presos e egressos; incremento do uso de tornozeleiras
eletrônicas; difusão das audiências de custódia; desburocratização
do tribunal do júri para fazer frente ao
elevado número de homicídios; incremento do banco
de boas práticas do Poder Judiciário; retomada da
Rede de Governança Colaborativa; universalização
e aperfeiçoamento do Processo Judicial eletrônico
(PJe); rediscussão dos juizados especiais; rediscussão
do atual modelo de execução fiscal; criação de setor
para destravar empreendimentos de infraestrutura
paralisados por pendências judiciais. Incremento dos
programas de proteção a vítimas de violência, com especial
atenção à violência doméstica e contra crianças
e adolescentes; integração, sistematização e modernização
da coleta e da análise estatística de dados pelo
Poder Judiciário; continuidade dos programas criados
nas gestões anteriores e lançamento de novos programas
e desafios; adoção de campanhas educativas,
com a utilização da TV Justiça e da Rádio Justiça como
emissoras educativas; por fim, accountability: juízes e
tribunais devem prestar contas do exercício de suas
funções jurisdicionais e administrativas.