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SAÚDE
Divulgação
Quando a
audição dá
sinais de alerta
O teste da orelhinha é fundamental para
ajudar a diagnosticar alterações que podem
acarretar problemas futuros
Interrupções e dificuldades em detectar sons, localizá
los, discriminá-los, memorizá-los, reconhecê-
-los e compreendê-los levam a prejuízos funcionais
importantes no desenvolvimento da criança quando
não são precocemente detectadas. Por essas razões,
fonoaudiólogos, otorrinolaringologistas e pediatras
preocupam-se com a promoção de campanhas de
conscientização da população e dos profissionais
da saúde sobre a importância da identificação e do
diagnóstico precoce da deficiência auditiva, seguidos
imediatamente de medidas de intervenção médica e
fonoaudiológica.
“Já sabemos que os melhores resultados na reabilitação
auditiva e desenvolvimento de linguagem
de pessoas acometidas pela deficiência auditiva
acontecem em crianças tratadas antes dos dois
anos de idade”, afirma a otorrinolaringologista
Renata Di Francesco, presidente do Departamento
de Otorrinolaringologia da Sociedade de Pediatria
de São Paulo. Isso acontece porque o sistema nervoso
central apresenta grande plasticidade quando
precocemente estimulado, permitindo o aumento de
conexões nervosas.
No passado, o diagnóstico das alterações auditivas
ocorria tardiamente, por volta dos três ou quatro
anos de idade. Só que dentre as doenças passíveis de
triagem logo ao nascimento, a deficiência auditiva é
a que apresenta a mais alta taxa de incidência – varia
de um a seis casos a cada mil nascidos vivos e de um
a quatro casos a cada 100 recém-nascidos prematuros.
Comparando-a com outras doenças de triagem
neonatal universal, como fenilcetonúria (0,07/1000),
hipotireoidismo congênito (0,17/1000), anemia
falciforme (0,20/1000) ou hiperplasia congênita de
supra-renal (0,14/1000), verifica-se a importância de
uma triagem neonatal desse problema.
Desde 2010 o teste da orelhinha é – ao lado dos
exames do pezinho, do olhinho e do coraçãozinho
– obrigatório e gratuito nas crianças nascidas
em hospitais e maternidades, em razão da Lei nº
12.303/2010. Para as crianças que nascem fora do
ambiente hospitalar, a avaliação deve ser feita antes
de completarem três meses de vida.
A verificação consiste em um exame de emissões
otoacústicas, de fácil realização e interpretação, que
pode ser feito com o bebê dormindo em sono natural.
Não é invasivo, sem contraindicações, indolor e de
rápida duração (cerca de dez minutos).
Renata Di Francesco, que também é professora
livre-docente da Disciplina de Otorrinolaringologia
da Faculdade de Medicina da USP, explica o procedimento:
“Testa-se a função da cóclea (parte interna
da orelha). Um pequeno som é emitido por um fone
inserido na orelha do bebê, que estimula contrações
das células do ouvido. Essas contrações produzem
um novo som, muito baixo, que são as emissões
otoacústicas e que são captadas pelo microfone
presente no próprio fone”.
É o som de retorno, captado pela sonda no conduto
auditivo, que aponta a presença e integridade da
cóclea. Caso não haja resposta, é provável que exista
um problema na audição. É preciso lembrar que o
otoacústico, por si só, não é um atestado de que exista
um problema. Além disso, não é capaz de medir a
gravidade da lesão e de identificar a causa. Assim, em
caso de resultado não satisfatório, exames complementares
e mais detalhados serão realizados, como
o de potencial evocado auditivo do tronco encefálico,
além de verificação por imagem ou análise genética.
Determinar a causa e o nível da lesão é fundamental
para a adequação dos métodos terapêuticos multidisciplinares
e educacionais que deverão ser utilizados
na reabilitação da criança. “Os tratamentos mais
comuns são os aparelhos de ampliação sonora e, em
casos de surdez profunda, pode-se indicar o implante
coclear, além de intervenção fonoaudiológica para estímulo
e desenvolvimento da fala”, diz a especialista.
Define-se como deficiência auditiva qualquer diminuição
da audição provocada por desvio ou mudança
das estruturas ou da função além dos limites usuais.
As causas são malformações congênitas, doenças
genéticas e doenças infecciosas que atingem as
gestantes (incluindo rubéola, sarampo, varicela,
diabetes e uso de álcool), medicamentos tóxicos ao
ouvido, complicações durante o parto, sofrimento
fetal, falta de oxigênio, nascimento prematuro e
circular de cordão umbilical.
Mesmo aquelas crianças que apresentarem resultados
satisfatórios na triagem da orelhinha deverão
ter o desenvolvimento do seu sistema auditivo
acompanhado pelos pais e pelos profissionais de
saúde. De acordo com a especialista, as crianças
podem ter perdas auditivas mais leves que aparecem
tardiamente.
“Os pais devem estar atentos aos sinais de perda
auditiva, tais como atraso no desenvolvimento da fala,
fala ininteligível ou trocas importantes de fonemas,
criança que entende as palavras de forma errada, pede
constantemente para repetir, não atende prontamente
a chamados, fica muito próxima da TV ou aproxima
demais tablets ou brinquedos sonoros do ouvido.
Em crianças maiores, dificuldades de alfabetização
também podem ser um alerta”, orienta Renata.
Vale ressaltar que a audição precisa de cuidados
durante toda a vida. O envelhecimento, a exposição
a ruídos ou sons altos, uso constante do fone de
ouvido, cotonetes ou até mesmo doenças podem
reduzir a capacidade auditiva. Uma boa comunicação
é essencial para o bem-estar na terceira idade nesse
campo. A incapacidade auditiva, com o decorrer do
tempo, pode levar ao isolamento social progressivo
e até à depressão do idoso, principalmente se ele
tiver outras limitações funcionais, como dificuldade
para andar.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estática
(IBGE), mais de 9 milhões de brasileiros possuem
algum tipo de deficiência auditiva.