Comente aqui sobre o tema da entrevista
Hemettérriio
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Duas, três, no máximo quatro pessoas de etnia negra
em cargos mais relevantes. Precisamos de políticas
públicas mais inclusivas, o que passa pelo crivo de
uma boa educação pública com qualidade suficiente
para colocar negros em condições de concorrer em
pé de igualdade com os demais. Se não houver o
crivo da educação de qualidade é impossível pensar
em igualdade.
No Brasil, levantamentos apontam que a remuneração
pelo trabalho da mulher é menor que do homem.
Qual o caminho para corrigir essa injustiça?
Na realidade, precisamos mudar a nossa cultura. Nos
grandes empregadores, na maioria das ocasiões, os
contratantes são homens e isso reflete na determinação
injusta da remuneração da mulher. Há situações
piores, como, por exemplo, quando se quer igualar a
remuneração, e isso é feito reduzindo os pagamentos
para os empregados homens, nivelando por baixo. É
uma cultura presente globalmente, haja vista o movimento
de atrizes em Hollywood, onde sempre os artistas
homens ganham salários maiores. É necessária
uma revolução de mentalidade para voltar o olhar para
o produto, para o resultado da atividade. Havendo o
mesmo rendimento não há motivo para discriminar e
pagar salário diferente para homem ou mulher, branco
ou negro ou qualquer outra condição que extrapole
o resultado. A Justiça do Trabalho somente iguala
os salários de homens e mulheres nos ditames da
legislação, cujo texto estabelece que para trabalho de
igual valor, em paridade com perfeição técnica, deve
ser pago o mesmo salário, seja homem ou mulher.
Qual o principal reflexo do primeiro ano de vigência
da reforma trabalhista?
Em tese, houve uma cautela muito grande para o
ajuizamento de ações trabalhistas devido a introdução
dos honorários sucumbenciais em desfavor do
trabalhador, que agora avalia o direito que reivindica e
se conseguirá produzir uma prova segura. Conforme
podemos ver pela estatística do Tribunal, o ranking de
assuntos discutidos na Justiça do Trabalho, de janeiro
a setembro de 2018, permaneceu quase o mesmo do
ano passado: pagamento de aviso prévio, pagamento
das verbas rescisórias (art. 477, CLT), multa de 40%
do FGTS e pagamento de férias proporcionais. Todas
essas matérias são questões práticas – pagou ou não
pagou –, o que não sofreu interferência de qualquer
mudança na legislação processual trabalhista. Daí
se deduz que, se houve redução de processos, não
foi por conta dessas questões. Por outro lado, há
questões controvertidas da reforma aguardando
posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF),
em destaque o trabalho de gestantes em condições
insalubres e a valoração do dano moral conforme a
remuneração do ofendido. Enquanto o Supremo não
se posiciona, o trabalhador que foi demitido vai aguardar
durante os dois anos do prazo prescricional para
ajuizar a reclamação. Não temos dados suficientes
para analisar e afirmar que houve uma diminuição
real do número de processos trabalhistas, creio que
depois de passados dois anos vamos ter condições
de dizer com mais precisão as consequências da
reforma trabalhista.
Na sua visão, a legislação trabalhista é determinante
para a geração de empregos?
É surreal pensar assim. O Direito do Trabalho não
implica em questões financeiras, não determina os
gastos de uma empresa com a produção e não é
questão de legislação trabalhista o pagamento de
impostos e taxas. Veja, falamos de um país onde se
vai à Justiça para cobrar o pagamento de aviso prévio,
verbas rescisórias e férias proporcionais e não para
reivindicar melhores condições, como um ambiente
sociocultural mais desenvolvido nos locais de trabalho.
O que o trabalhador recebe de contraprestação
pelo serviço dele não pode ser confundido com taxa
ou imposto, são institutos completamente diferentes
e que não se confundem. Então, partir da premissa de
que o Direito do Trabalho cria emprego, que legislação
trabalhista é óbice ao emprego, é a mesma coisa que
dizer que a Justiça do Trabalho determina como que
devem ser as finanças, como deve ser a economia.
Políticas de incentivo ao trabalho e à economia não
pertencem ao Direito do Trabalho, nós julgamos
questões relativas às relações de trabalho depois
que alguma conduta foi praticada. Se não temos
políticas direcionadas para a criação de postos de
trabalho, qualificação e recolocação do trabalhador
não há razões para acreditar que é a legislação que
vai modificar essa situação.
Jornal do Advogado – Ano XLIV – nº 444 – Novembro de 2018
SÃO PAULO
As mudanças na legislação trabalhista qualificaram
ou deterioraram a representação sindical dos
trabalhadores?
Não sou a dona da verdade, mas pela experiência que
tenho com relações de trabalho, imagino que as representações
de trabalhadores e empregadores não estão
sabendo como solucionar o impasse do fim da contribuição
sindical obrigatória. Foi uma escolha do nosso
legislador que talvez tenha de ser repensada para criar
uma solução. A Organização Internacional do Trabalho
(OIT) determina a liberdade sindical, que implica em
pluralidade de sindicatos de uma mesma categoria,
dando ao trabalhador a faculdade de escolher quem o
representa. Esse modelo obriga os sindicatos a melhorarem
sua atuação, maneira de incentivar a contribuição
voluntária dos trabalhadores. No Brasil, ainda temos a
unicidade sindical, o que vale dizer que o trabalhador
não pode escolher o seu sindicato. De modo que, para
evitar o que verificamos hoje, a extinção da contribuição
sindical obrigatória deveria ocorrer depois da mudança
para o modelo da OIT, numa reforma sindical, algo debatido
desde a década de 90 e que nunca conseguimos
levar adiante. A proposta da recente reforma trabalhista
era a liberdade da negociação coletiva, mas se nós
tivermos sujeitos coletivos díspares, um muito forte e
outro muito fraco, essa relação fica abalada.
Qual o principal ponto falho na argumentação de
correntes que defendem a solução de litígios trabalhistas
na Justiça Comum?
É a mesma coisa que dizer para o médico especialista
em doenças cardíacas que ele não pode operar em
hospital especializado em doenças cardíacas, devendo
ir para uma clínica geral. A especialização é importante
em tudo, todos os setores partem para a esse caminho
e nós temos uma Justiça especializada montada, que
funciona e que é a mais rápida: vamos abrir mão de
tudo isso por quê? Por ideologia? Não creio que seja
correto. Eu não vejo nenhum motivo para extinguir uma
Justiça do Trabalho que está totalmente estruturada
com carreiras de juízes, servidores e tudo mais, para
incorporar em outra Justiça que não tem essa estrutura.
Eu não vejo lógica para chegar ao entendimento
de que a Justiça do Trabalho precisa acabar.
O orçamento para o Tribunal em 2019 deve impor
dificuldades e desafios?
Independentemente de haver cortes orçamentários, os
nossos recursos financeiros são reduzidos diante das
nossas necessidades. Nós temos todos os reajustes que
qualquer empreendedor tem com as despesas básicas
de água, luz, telefone e, principalmente, com informática,
área em que demandamos novos programas e o treinamento
dos servidores. Uma dificuldade que estamos
prevendo agravar-se nos próximos anos é a redução no
número de magistrados e servidores, em decorrência da
proibição de ampliação do quadro de pessoal. A reposição
daqueles que passam para o quadro de inativos ocorre
quando o cargo fica vago, ou seja, estamos falando
de alguém que não vá deixar ascendentes, descendentes
ou cônjuge para que a quantia referente à aposentadoria
não se transforme em pensão e isso é praticamente impossível.
O quadro de pessoal está se restringindo cada
vez mais e o orçamento continua mesmo.
“Precisamos de políticas públicas mais inclusivas, o
que passa pelo crivo de uma boa educação pública com
qualidade suficiente para colocar negros em condições
de concorrer em pé de igualdade com os demais”