ENTREVISTA
Professor de Direito, cofundador e diretor do Centro
para o Estudo do Direito e Cultura na Columbia Law
School, Kendall Thomas lecionou em diversos países
como França, Holanda, Inglaterra, República Tcheca,
Alemanha, Haiti e África do Sul. Ativista dos direitos
humanos, tem atuação voltada às minorias, mulheres
e negros. Nesta entrevista, reflete sobre a luta para
efetivar as garantias individuais destes cidadãos, bem
como os avanços e desafios conquistados durante os
70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos completa
70 anos. Houve mais avanços ou contratempos?
É difícil, se não impossível, para os advogados da minha
geração imaginar um mundo sem a Declaração Universal
dos Direitos Humanos (DUDH) ou sem a “ideia de
direitos humanos”. A conquista só pode ser totalmente
apreciada lembrando o contexto histórico do qual ela
surgiu. Os homens e mulheres que desejaram a DUDH
tinham acabado de viver duas terríveis guerras mundiais,
sendo que a segunda culminou na produção e uso
de armas atômicas, cuja destrutividade e devastação
serviram como as dores do parto para a nova realidade
do pós-guerra: a era nuclear e destruição mutuamente
assegurada. O pronunciamento de que a “dignidade
inerente e dos direitos iguais e inalienáveis de todos os
membros da família humana é o fundamento da liberdade,
justiça e paz no mundo” pode parecer singular
para nós hoje, mas nunca devemos esquecer que essas
palavras foram escritas no sangue, lágrimas e cinzas de
milhões de homens, mulheres e crianças massacrados,
mutilados, presos, torturados, aprisionados e expulsos
de suas casas e pátrias. Nos 70 anos, desde que foi
escrito, o planeta foi poupado de uma Terceira Guerra
Mundial. Nós nunca saberemos se, ou em que medida, a
DUDH é responsável pela “paz quente” que se manteve
desde sua adoção. No entanto, acho que está claro que
a DUDH constituiu uma comunidade internacional de
direitos humanos, que a utilizou e outros instrumentos,
como um recurso para defender alternativas à guerra e
à violência. Dito isso, como o filósofo Jacques Derrida,
acho que a maior lição que devemos tirar da Declaração
e da “Era dos Direitos Humanos” que ela inaugurou é
que são direitos ao mesmo tempo indispensáveis, mas
insuficientes.
Quais são os principais desafios para a defesa desses
direitos nos próximos anos?
Acredito que haverá uma série de desafios contínuos,
que podem vir a ser lembrados como a “Era da Desumanidade”.
O compromisso mundial com a ideia de
direitos humanos já está sendo testado, até o ponto
de ruptura, pela migração e refugiados e a epidemia de
apatridia; o uso do terror como política; o etnonacionalismo,
xenofobia e pensamento “tribalista”; e a indiferença
das nações em relação aos direitos básicos de
José Luís da Conceição
populações vulneráveis – mulheres, pessoas LGBTQI+,
grupos raciais e étnicos, minorias religiosas e outros
Kendall
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