12 Jornal do Advogado I Fevereiro-2019
Rogério Sanches Cunha
Promotor de Justiça em São Paulo, professor da
Escola Superior do Ministério Público dos estados
de São Paulo e de Mato Grosso e professor de
Direito Penal e Processo Penal do CERS
SIM
Divulgação
Antes de “julgar” a (im)pertinência da adoção, pelo nosso ordenamento, do
plea bargain, importante tecer breves comentários sobre o modelo consensuado
(consensual) de Justiça, diametralmente oposto ao modelo conflitivo.
No modelo consensuado percebe-se o firme propósito de trazer à Justiça
criminal arquétipos de acordos que trabalham, de forma ímpar, a reparação
de danos, a plena satisfação das expectativas sociais por Justiça e a
solução célere da lide.
Os acordos na seara criminal podem ser compreendidos, em geral, como
ajustes obrigacionais celebrados entre o órgão de acusação e o investigado/
acusado (assistido por advogado), que, assumindo ou não sua culpa/responsabilidade,
aceita cumprir, desde logo, condições/sanções homologadas
pelo magistrado, fiscal do negócio jurídico.
Sobretudo em países do commom law, o uso corriqueiro da Justiça
negociada e dos acordos penais demonstrou a utilidade do instituto,
principalmente para evitar o colapso do sistema de Justiça, incapaz de
conciliar as formalidades procedimentais e o tempo necessário para
dar respostas tempestivas que aplacassem satisfatoriamente o clamor
decorrente dos crimes.
No Brasil, o instituto da transação penal, criado pela Lei 9.099/95, é considerado
a semente da Justiça consensuada (da qual negociada aparece como
a mais promissora espécie). Talvez a mais significativa diferença desse
instituto com o do plea bargain, é que naquele não existe reconhecimento de
culpa (plea of nolo contendere) e, consequentemente, imposição de pena.
A Resolução nº 181/17 do Conselho Nacional do Ministério Público
(CNMP), alterada pela Resolução nº 183, aparece como a mais recente
mola propulsora da Justiça negociada, prevendo o denominado acordo de
não persecução penal.
O plea bargain está em fase de “gestação” legislativa, desde logo merecendo
nossos aplausos.
O crescimento de uma perspectiva pragmática do Direito, fincado na busca
pelos melhores resultados produtivos e úteis, deu ensejo à multiplicação
de instrumentos negociais que, a um só tempo, cumprem expectativas dos
indivíduos e agentes políticos-econômicos, porque abreviam o tempo para
a solução do conflito, e atendem um prático cálculo de utilidade social.
O consenso entre as partes se estabelece em um ambiente de coparticipação
racional, mediante vantagens recíprocas que concorrem para
uma aceitabilidade no cumprimento da medida mais efetiva, sentimento
que eleva o senso de autorresponsabilidade e comprometimento com o
acordo, atributos que reforçam a confiança no seu cumprimento integral.
Inegavelmente, o plea bargain trará economia de tempo e recursos para
que o sistema de Justiça criminal exerça, com a atenção devida, uma tutela
penal mais efetiva nos crimes que merecem esse tratamento.
Não se pode negar (nem mesmo o mais otimista dos operadores do Direito)
a incapacidade de o Judiciário dirimir, tempestiva e satisfatoriamente, todos
os conflitos que a ele são levados. É muito mais vantajoso uma imediata
decisão negociada, que cumpra a função dirimente do conflito, do que uma
decisão proferida ao longo de anos.
Como bem alertam Rosa e Lopes Júnior, somente “os juristas desatualizados
insistem em excluir os institutos da Justiça negociada do ambiente
processual brasileiro, lutando por manter a ilha moderna do processo
penal e o fetiche pela decisão penal de mérito como o único mecanismo
de descoberta e de produção de sanções estatais” (http://www.conjur.
com.br/2017-set-22/limite-penal-saldao-penal-popularizacao-logica-
-colaboracao-premiada-cnmp, consultado no dia 09/10/2017).
De tal maneira, é possível concluir que a realização de acordos penais no
Brasil – apesar de não ser a única e suficiente alternativa para a resolução
dos graves problemas de nosso sistema – afigura-se como uma medida
imprescindível e urgente para deflagrar um sério processo de aprimoramento
e reforma do modo com que é realizada a nossa persecução penal.
Debate
O Brasil deve adotar
Sobretudo
em países
do commom
law, o uso
corriqueiro
da Justiça
negociada e
dos acordos
penais
demonstrou
a utilidade
do instituto,
principalmente
para evitar o
colapso do
sistema de
Justiça
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