Jornal da Advocacia – Ano XLIV – nº 448
Jornal da Advocacia I Abril-2019 11
SÃO PAULO
A advocacia
do século XXI
Tayon Berlanga
É importante compreender a
importância de a advocacia evoluir
para uma nova realidade social
A agenda das instituições de ensino superior do Direito tem
como tarefa urgente a reformulação de currículos. A Resolução
nº 5 do MEC e Conselho Nacional de Educação, publicada
em dezembro de 2018, determina as Diretrizes Curriculares
Nacionais do curso e o prazo dado para os ajustes foi fixado
em dois anos. Embora receba críticas, o documento traz
determinações que movem a grade rumo à consolidação de
exigências de um novo perfil de advocacia, como o domínio de
tecnologias, desenvolver a cultura do diálogo e o uso de meios
consensuais de resolução de conflitos, além do incentivo a
saberes em outras áreas, como ciência política e economia.
“O ensino do Direito ainda tem uma visão conteudista do
século XIX. Mas o século XXI exige outro tipo de profissional,
com as chamadas habilidades socioemocionais”, resume Nina
Ranieri, professora da Faculdade de Direito da USP. Isso quer
dizer desenvolver, entre outras características, capacidades de
liderança e de compreensão mais ampla do mundo, de modo
que operadoras e operadores do Direito se tornem arquitetas
e arquitetos de soluções. “Costumava-se dizer que o que não
está nos autos não está no mundo do Direito. Isso acabou”,
pontua. Ir além da leitura e interpretação da lei está em linha
com avaliação do presidente da Comissão de Ensino Jurídico
da OAB SP, Tayon Berlanga.
O estudante ainda é criado para a natureza do contencioso
em um mundo impactado pela tecnologia, onde escritórios
investem cada vez mais em inteligência artificial e parte do trabalho
passa a ser feita por robôs. “Antes de pensar no impacto
Encontro com alunos
tecnológico na esfera contenciosa, é preciso compreender a
importância de a advocacia evoluir para uma nova realidade
social”, diz Berlanga. Segundo ele, os alunos devem ser
preparados dentro de nova visão, que chama de advocacia
preventiva. É estar mais apto para enxergar saídas distintas
para problemas que possam ser resolvidos por mais de uma
via, a exemplo da mediação e da conciliação.
Em uma das ações da OAB vai à Escola, Andrea Regina
Gomes profere palestra no Senai da Barra Funda
OAB vai à Escola
No universo educacional, fora contribuições ligadas ao
ensino jurídico, a Secional busca cooperar com a formação
de cidadãos ao levar conhecimentos de direitos
básicos aos alunos do ensino médio de todo o estado
de São Paulo por meio do projeto OAB vai à Escola. “O
foco é o fomento à cidadania”, resume Andréa Regina
Gomes, que lidera a Comissão. Tendo como base o
artigo 5º da Constituição Federal, que trata dos direitos
e garantias fundamentais, o programa aborda temas
para o convívio dentro e fora das salas de aula, desde
os mais atuais, como a formação de novas famílias e a
prática do bullying, passando por questões trabalhistas,
até relações de consumo e de acessibilidade. Para
definir os conteúdos a serem dados em sala de aula,
Arquivo pessoal
José Luís da Conceição
Diante das novas diretrizes, importante tarefa para a Comissão
no triênio será organizar simpósios com a presença de profissionais
da área acadêmica. “Até para que as instituições possam
compreender a visão da Ordem sobre a nova advocacia”,
diz Berlanga. Ele comenta que iniciativa similar também pauta
o Conselho Federal e que as modificações acabarão por levar
a OAB a adequar o Exame de Ordem em nível nacional.
Nina, da USP, vê como iniciativas para ampliar pontos fortes
no ensino, o aumento de diversidade de gênero no corpo
docente e dos convênios acadêmicos com universidades
representantes da Ordem paulista reúnem-se com diretoria
e professores das escolas interessadas. A partir
daí é estabelecido o cronograma. Além dos tópicos
já citados, são abordados, ainda, direito à saúde, das
pessoas com deficiência e as leis sobre violência contra
a mulher, igualdade racial, direitos dos idosos, internet
e cidadania digital. O programa se estende para as
Subseções. “O que buscamos fazer é orientar os mais
jovens para que possam ter seus direitos respeitados.
Por conta disso, as palestras devem ser proferidas
com uma linguagem próxima de seus conhecimentos”,
reforça Andréa. A cartilha da OAB vai à Escola reúne o
material e está disponível por meio do site da instituição
e de aplicativo.
Simpósio
nacionais e internacionais, além de buscar feedback dos
ex-alunos, entre outras. Marina Feferbaum, coordenadora de
ensino da Faculdade de Direito da FGV, conta que mudanças
foram implementadas recentemente. Em uma atividade de
laboratório, com foco em automação de documentos jurídicos,
ela observou que os estudantes também desenvolveram
habilidades socioemocionais. “O trabalho em equipe ainda é
relegado no Direito e notamos que esse foi o maior desafio
para eles nessa tarefa, e não o de programar em si”, disse.
A necessidade de modernizar as atividades do núcleo de
práticas jurídicas e o aumento de disciplinas, porém mantendo
a carga horária, fizeram parte das críticas. Para Nina, apostar
em interdisciplinaridade com mais material exige dedicação
em período integral, realidade em países onde a educação
do Direito já segue caráter multidisciplinar. Ela conta que a
Faculdade de Direito da USP, a mais tradicional do país e
líder de rankings nacionais, está se dedicando a modernizar o
currículo. Mas enfrenta dificuldades em escalar posições em
medições internacionais por uma série de fatores, entre eles, o
fato de os professores não conseguirem se dedicar em tempo
integral à vida acadêmica.
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