Valéria de
Souza
Educação
Doutora em Educação pela PUC-SP, Valéria de Souza trabalha há 32
anos na rede pública do Estado. Foi coordenadora de gestão da educação
básica e da Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Profissionais
da Educação de São Paulo – responsável pela formação continuada de
cerca de 200 mil profissionais. Atualmente supervisora de ensino da Rede
Estadual, defende o investimento na base como ponto fundamental para o
crescimento brasileiro. “A instituição escolar tem uma clara função social,
capacitando nossos estudantes para se tornarem cidadãos autônomos por
meio do desenvolvimento de suas potencialidades”, diz.
– Mesmo com variações de enfoque, educação tem sido pauta presente nas
oito Constituições brasileiras. Apesar desse cuidado, não temos no Brasil
“política de Estado” para tratar do tema e, sim, políticas de governo. Concorda
com essa interpretação?
– Concordo plenamente. Este anseio por uma política de estado para a educação
tem sido uma luta histórica que toma forma com o “Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova”, de 1932, sendo um posicionamento formal de intelectuais que se
manifestam veementemente contra os descasos do Estado para com a educação.
Avançamos com a Constituição Federal de 1988, por meio da Emenda Constitucional
n° 59/2009, ao garantir o estabelecimento do Plano Nacional de Educação
(PNE), com duração de dez anos, com o objetivo de articular o sistema nacional
de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e
estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento
do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações
integradas dos poderes públicos das diferentes esferas da federação. O primeiro
PNE (2001-2010) foi sancionado, por meio da Lei n° 10.172, de 9 de janeiro de
2001, porém, segundo vários autores, o Plano traduziu-se mais em políticas e ações
governamentais do que, necessariamente, em políticas de Estado. Esperemos que
no PNE vigente (2014/2024) possamos avançar nesta perspectiva.
– De maneira geral, a questão da Educação está em ebulição, entre outras
razões, por conta dos contingenciamentos de verbas do MEC propostos
pelo governo. Essa situação pode ser uma oportunidade para se discutir
a questão do tratamento dado à Educação no Brasil ou, ao contrário, pode
adiar o enfrentamento de temas essenciais à implantação de políticas públicas
para o setor?
– A questão da chamada crise do Ministério da Educação pode, por um lado,
mobilizar a comunidade científica, educadores, sociedade em geral, estudantes
e seus familiares na defesa da educação como agenda estratégica para o Brasil.
Porém, é necessário destacar que a inanição do MEC nestes quatro primeiros
meses traz um grande prejuízo para a política educacional. Tão grave quanto a
inanição são os temas irrelevantes, alguns deles abordados nesta entrevista, que
foram colocados em pauta e que, infelizmente, desviam da agenda estratégica e
urgente necessária para o avanço da educação nacional.
– Na década de 80, o Brasil ainda não tinha vagas para todas as crianças
em idade escolar e constava na lista dos nove países com maiores taxas
de analfabetismo (25,9% / IBGE). Esses dados são suficientes para afirmar
que nunca houve política educacional até mesmo entre os anos 60 e 70, ao
contrário do que se diz?
– Realmente, quando observamos que, na década de 80, ainda possuíamos em
nosso país uma taxa de analfabetismo de 25,9%, nos parece muito alta e reflete,
em grande parte, uma ausência de políticas focadas neste grave problema. Porém,
quando analisamos os dados do século passado, percebemos que as transformações
sociais, econômicas e políticas, em especial a passagem de um país
essencialmente agrário para um país industrializado, impactaram positivamente
nas taxas de analfabetismo. Saímos, segundo dados do IBGE, de uma taxa de
65,3% em 1900 para 13,5% em 2000 (população na faixa de 15 anos ou mais).
Necessário destacar que, se tivéssemos tido uma política exitosa voltada para atacar
este problema, poderíamos ter chegado em quase zero de analfabetismo como
Entrevista
Arquivo pessoal
14 Jornal da Advocacia I Abril-2019