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Metais perigosos Antes de pensar no visual e no bolso, é preciso 22 SAÚDE Colares, brincos, pulseiras e anéis coloridos, com preços baixos, atraem facilmente a atenção. O valor pode ser um fator importante na hora da decisão, mas deve estar também associado à qualidade do acessório. Uma bijuteria barata poupa o bolso, mas é um risco potencial para a saúde. Isso porque nesses acessórios, principalmente naqueles importados da China, têm sido encontradas cada vez mais altas concentrações de cádmio, um metal pesado que, mesmo em baixas concentrações, é extremamente tóxico. As bijuterias, em geral, são compostas por uma peça base formada por uma liga de metal revestida por outro metal, que deixa a peça niquelada, cromada, dourada ou prateada – o chamado “banho”. A qualidade de uma peça, seja para sua durabilidade, ou para a segurança do uso, está ligada ao metal que é depositado nela e a quantidade desse material. “O cádmio, por ser um material maleável, é utilizado como liga junto com o zinco na produção de bijuterias. O zinco apresenta um valor de mercado muito superior ao cádmio, assim, uma menor concentração de zinco e maior de cádmio resulta em uma maior economia para a indústria desses produtos”, explica a toxicologista Nancy dos Santos Barbi, do Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “A concentração desse metal não deveria ultrapassar 0,03% e ele foi encontrado em concentrações de até 80% em bijuterias importadas da China”, salienta. Em 2013, a Receita Federal interceptou dois contêineres chineses com 16 toneladas de bijuterias. A suspeita era de fraude fiscal, mas os peritos acabaram por descobrir outros problemas. Uma amostragem de 24 bijuterias do carregamento apreendido foi analisada. Catorze delas tinham a presença de cádmio em quantidades que variavam de 32% a 39% da liga metálica – porcentagem quase 4 mil vezes maior do que a permitida na Europa, onde a presença desse metal não deve ultrapassar a taxa de 0,01%. Nos Estados Unidos a presença do cádmio em bijuterias não pode ser superior a 0,03%. Muitos são os efeitos indesejados do cádmio já conhe- saber que acessórios baratos podem conter alta concentração de elementos tóxicos cidos, tanto para seres humanos quanto para plantas e animais. O metal foi incluído no Registro Internacional de Substâncias Químicas Potencialmente Tóxicas do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. No ano passado, uma portaria interministerial, organizada pelos Ministérios do Trabalho e Emprego, da Saúde e da Previdência Social do Brasil, adicionou o cádmio e os compostos de cádmio à Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos (LINACH). A toxicidade de um metal depende da dose ou do tempo de exposição, da forma física e química do elemento e da via de absorção. A entrada do cádmio no organismo se dá principalmente pela inalação de ambientes de fundição, mas ele também pode ser absorvido pelas vias dérmica (contato com bijuterias, baterias, tintas, cosméticos, cerâmicas, cigarros, celulares, TV, computadores e outros aparelhos eletrônicos) e gastrointestinal (quando absorvido do solo por vegetais que serão consumidos em decorrência, principalmente, de descarte inadequado de objetos com concentrações de cádmio). “Apesar de a absorção dérmica ocorrer de forma lenta, deve-se considerar que o contato por longo prazo com objetos contendo este metal, como bijuterias, pode ser prejudicial à saúde. O cádmio permanece dentro do nosso organismo por cerca de 30 anos e a sua eliminação ocorre de forma ainda mais lenta do que a absorção, sendo, portanto, esta, uma via de absorção importante em relação aos riscos por exposição ao cádmio”, ressalta Nancy Barbi. Sintomas A intoxicação aguda por cádmio resulta em dor abdominal, náusea e sérios problemas pulmonares e respiratórios. Já a intoxicação crônica a baixas concentrações afeta especialmente os rins, comprometendo irreversivelmente a habilidade de remover ácidos do sangue. Seu acúmulo no organismo implica em desenvolvimento de problemas cardiovasculares, fraqueza muscular, acúmulo de ácido úrico nas articulações (gota) e ossos enfraquecidos, levando a doenças como a osteoporose. Além disso, muitos compostos de cádmio são também cancerígenos. “Em alguns casos o dano é irreversível, como na lesão renal crônica, que pode levar a uma doença que causa deformidade óssea pela perda de Vitamina D e cálcio e que acometeu dezenas de pessoas no Japão na década de 1970 (conhecida como doença de itai-itai ou doença doi-doi). O cádmio também está associado com o câncer renal, de próstata, pulmonar e pancreático”, salienta a toxicologista.Fumantes, alérgicos e pessoas com algum tipo de ferimento na pele estão mais expostos ao cádmio. A presença em excesso de metais pesados e a deficiência de minerais essenciais no organismo podem ser detectadas por meio de um sofisticado exame, chamado mineralograma. Já bastante realizado nos Estados Unidos, Europa e Japão, é de uso ainda recente no Brasil e está disponível apenas na rede privada. O procedimento é feito a partir de uma amostra de dois gramas de cabelo, que é enviada a laboratório para análise. A depender do grau de intoxicação por metais pesados revelados nesse exame, dietas específicas e suplementos vitamínicos podem retirar os metais tóxicos, além de prevenir potenciais doenças. Normatização a caminho O Brasil ainda não possui legislação consolidada proibindo elementos tóxicos como o cádmio ou mesmo especificando quantidades seguras nos produtos. O Inmetro, no entanto, pretende regulamentar o seu uso em joias e bijuterias fabricadas e vendidas no país. Os índices permitidos na Europa e nos Estados Unidos servirão de base para a regulamentação brasileira. A portaria devia ter sido baixada em abril deste ano, mas até a data de fechamento desta edição ainda permanecia engavetada. Em resposta á indagação do Jornal do Advogado, o Inmetro informou que a portaria definitiva ainda não foi publicada porque “algumas questões levantadas durante a consulta pública estão sendo analisadas”. O instituto não informou um prazo para publicação. Na Câmara dos Deputados tramita um Projeto de Lei (PL 6.786/2013), de autoria o deputado Henrique Oliveira (SDD/AM), que limita o percentual permitido do metal cádmio nas bijuterias, acessórios assemelhados e brinquedos em até 0,03%. O PL aguarda parecer do relator na Comissão de Seguridade Social e Família para ser enviado à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Enquanto isso, o consumidor não tem como atestar se há ou não a presença de cádmio nas bijuterias. “Como nas embalagens não existe informações sobre as concentrações de cádmio e outros metais pesados presentes nesses produtos, fica difícil para o consumidor fazer a sua escolha em função de suas qualidades. O que se recomenda é que não adquira produtos vendidos sem selo de garantia ou que sejam provenientes da China”, aconselha a toxicologista.


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