Page 6

Jornal427_web.pmd

FLEXIBILIDADE: De acordo com Villaça Azevedo, o Código atual é bem mais maleável e se aproximou da Constituição 6 EM QUESTÃO Código Civil ganha atualização com mais frequência Em decisão recente, Supremo Tribunal Federal extingue o artigo 1.790 e iguala direitos do casamento e da união estável Alterações no Código Civil trazem ao conjunto de normas discussões significativas, principalmente no Direito de Família e Sucessões, por conta das frequentes transformações das relações interpessoais. Em 10 de maio último, por exemplo, ao dar provimento aos Recursos Extraordinários 646.721-RS e 878.694-MG, ambos de repercussão geral (decisão que atinge uma série de processos idênticos), o STF declarou a inconstitucionalidade do artigo 1.790, que instituía o regime sucessório aplicado à união estável. Dessa forma, passou a reconhecer os mesmos direitos e deveres do casamento. Para o presidente da Comissão de Direito Civil da OAB SP, Marcelo de Almeida Villaça Azevedo, a decisão foi acertada por dar ao cônjuge e ao companheiro as mesmas prerrogativas e obrigações dentro dos regimes de bens. “Com a decisão, o STF fez justiça para quem construiu o patrimônio em conjunto e no fim das contas não tinha o benefício da herança”, diz. De acordo com o especialista, o artigo era o pomo da discórdia. O entendimento, no entanto, abriu questionamentos sob o ponto de vista do patrimônio pessoal. Nelson Sussumu Shikicima, que preside a Comissão de Direito de Família e Sucessões da Ordem paulista, também avalia que a decisão foi acertada a partir do momento que esclarece os dois conceitos. É válida, ainda, ao ter igualado os direitos pelo aspecto sucessório. Porém, ressalva que, quando se fala em planejamento patrimonial, acaba sendo prejudicial. “Antes, consultava-se um advogado para discutir a questão e mantinha-se em regime de união estável, para preservação dos bens provenientes de herança. Hoje, tanto faz.” Para ele, o erro do STF está na inconstitucionalidade do inteiro teor do artigo, quando, na verdade, a própria Constituição, em seu art. 226, § 3º, afirma que é reconhecida a união estável como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. “O que estava em discussão eram os incisos III e IV. Estes, sim, são inconstitucionais”, afirma Shikicima. A diferença dada pela nova compreensão está no fato de que, quando o cidadão era casado em comunhão parcial de bens e havia herança, a parte concorria com os filhos para os bens adquiridos somente na constância da união, mas não tinha direito às riquezas herdadas. Essa é apenas uma das alterações que modificou questões essenciais no Direito Civil, que rege a relação entre os cidadãos e estabelece o regime das pessoas jurídicas. Ainda na questão da família, a instituição da guarda compartilhada ajudou a disciplinar melhor a situação dos filhos de pais separados, a partir do momento em que passou a regrar o papel de cada um dos envolvidos. Mesmo nos casos de discordância, a Justiça determina divisão de responsabilidades sobre a criança. “Essa alteração mudou a dinâmica das famílias depois de uma separação. Os filhos passaram a entender melhor esse processo e a terem seus direitos respeitados”, avalia Shikicima. Tanto as famílias quanto o Judiciário demoram um tempo para se adequarem à realidade, mas tem ampliado a tomada de decisão nesse sentido. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ratifica essa linha: Somente entre 2014 e 2015, quando os dados foram compilados, a adesão passou de 7,5% para 12,9%. Ainda assim, é extremamente predominante a guarda unilateral, ficando os menores sob a custódia da mãe em quase 90% dos casos. Fim do engessamento Sob o aspecto da obrigatoriedade de alimentos, recentemente houve uma sentença inédita em que um juiz da 2a Vara da Família e Sucessões de São Carlos determinou que um tio, com situação financeira favorável, pagasse pensão alimentícia ao sobrinho, portador da Síndrome de Asperger – condição neurológica do espectro autista. O entendimento viria para mudar o conceito de pensão alimentícia, se não tivesse sido cassado por tribunal superior. Conforme os advogados, o pedido e a conquista são factíveis, mas serão derrubados pelo fato de não existir previsão legal. “A regra diz que é até o segundo grau. Terceiro grau não tem direito, pode ter uma exceção, mas tem de se vista caso a caso, pois tende a ser contestada”, avalia Shikicima. Os alimentos são para linha sucessória de sangue, de acordo com CC, que em seu artigo 1.697 deixa clara a regra para dependência de filhos, pais e avós. Há ainda a linha colateral. Outra importante mudança acerca de alimentos está na questão de excônjuges. Quando o casamento se desfaz e a outra pessoa fica em situação de necessidade, há previsão de pagamento; no entanto, a maioria das decisões deixou de ser pela vitaliciedade. Também cabe o pedido para o filho que ainda está no ventre da mãe. Essa previsibilidade foi trazida pela Lei nº 11.804/2008. Aliás, a possibilidade de alterações trazidas por novas leis ou decisões judiciais é elogiada. “Anteriormente, o Código era engessado. Agora, ele permite modificações”, diz Villaça, acrescentando que o Código, em vigor há 15 anos, ficou próximo da Constituição de 1988, principalmente quando são ressaltadas todas as questões de direito à personalidade. Os artigos 3º e 4º comprovam a prática quando da admissibilidade da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, que passou a regrar a capacidade das pessoas. Além disso, esses dispositivos deixam claro que, para as previsibilidades jurídicas civis, são incapazes os menores de 16 anos. A questão da incapacidade foi recentemente debatida. No começo deste ano, um jovem de 22 anos se recusou a fazer hemodiálise, levando a mãe a entrar na Justiça para pedir sua interdição, mesmo ele sendo civilmente capaz. Ela conseguiu decisão favorável na Justiça de primeira instância, mas a medida foi recebida com ressalvas. Villaça de Azevedo esclarece que ninguém pode ser constrangido a submeter se, com risco de morte, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica, conforme previsto no artigo 15 do Código. “A capacidade jurídica começa e morre com a pessoa. Ou seja, uma vez que sou capaz perante a lei e a Constituição, e não quero ser submetido a tratamento, é minha responsabilidade”, diz. José Luís da Conceição Confira o Código Civil


Jornal427_web.pmd
To see the actual publication please follow the link above