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E SE SUBMETER À QUARENTENA? José Roberto Manesco José Luís da Conceição Jornal do Advogado – Ano XLIII – nº 428 – Junho de 2017 SÃO PAULO Advogado especialista em Direito Público Acho uma temeridade que juízes do STF se preocupem com o que fazer depois de uma investidura temporária 13 Não incrível a capacidade que a nossa sociedade tem pra criar casuísmos como forma de resolver os naturais conflitos e divergências de interesse que surgem no seu seio. Infelizmente, esses casuísmos – apesar das boas intenções que os acalentem – vão contra os princípios e as tradições republicanas que buscam, por meio de regras não imutáveis, mas perenes, zelar pela convivência civilizada entre os cidadãos. Propor a instituição de mandato e quarentena aos juízes do STF é o casuísmo da vez. Em tempos difíceis para o país, com a crise política causando paralisia e apreensão generalizadas, mentes criativas tiraram da cartola essa ideia que entusiasma muita gente, por passar a impressão de que isso irá garantir decisões mais justas, equilibradas e, sobretudo, fiéis à Constituição, no Supremo. Ideias, como diria Odorico Paraguassu, de inspiração alienígena. No meu modo de entender, trata-se de grave equívoco. A independência e harmonia entre os poderes da República constitui norma constitucional insuscetível de ser alterada, pois é uma das chamadas cláusulas pétreas da nossa Carta Magna (vide art. 60, § 4o, inciso III). A independência no Poder Judiciário é garantida, principalmente, por meio da vitaliciedade, ou seja, investidura permanente no cargo. Assim, há um obstáculo insuperável para a instituição de mandato temporalmente determinado para os juízes da Corte: a impossibilidade de supressão de uma das garantias da magistratura que é condição indispensável para a independência do juiz. Ainda que não houvesse tal impeditivo, acho uma temeridade que juízes do STF se preocupem com o que fazer depois de uma investidura temporária. A insegurança gera intranquilidade que tende a comprometer a independência do juiz. Os argumentos favoráveis à investidura temporária (mandato) levam em conta o excessivo tempo de permanência dos seus membros na Corte. Isso pode ser resolvido de maneira mais simples e não casuística: basta aumentar a idade mínima para ocupar o cargo (hoje 35 anos) para 45 ou 50 anos. Além disso, o objetivo maior da investidura temporária do juiz é estabelecer algum controle social sobre o excesso de poder ou mesmo dos abusos no exercício da atividade judicial. Para isso, melhor remédio seria tornar menos burocrático o processo de impedimento ou a introdução de outras medidas na Carta Magna para coibir abusos de autoridade e decisões contra a Constituição. Nesse sentido, defendo Emenda Constitucional que não afete suas cláusulas pétreas e que a aprimoraria, de modo a permitir que a maioria qualificada de 3/5 do Senado possa suspender decisões da Suprema Corte, em sede de processos relativos à súmula vinculante ou de repercussão geral que afrontem, de maneira flagrante, a norma constitucional. Exemplo recente desse tipo de abuso foi a decisão do STF que permite, em afronta ao princípio constitucional da presunção de inocência, o recolhimento a ferros antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Essa proposta de aprimoramento constitucional viria no sentido de impedir que a Corte Suprema empreste interpretação manifestadamente contrária ao seu texto. Hoje, se ela o fizer, nada nos resta além de acatar e é isto que traz apreensão e gera açodamentos como o representado pela proposta do mandato temporário. No que diz respeito à quarentena para integrantes do Supremo que vierem a se aposentar, é necessário registrar que a proposição revela certo desconhecimento do modo como funciona nosso Judiciário. Imaginar que um ministro aposentado utilize-se do prestígio angariado nos anos de magistratura para favorecer um cliente, além de pôr em dúvida a reputação deles, aposentados e da ativa, nos faz questionar: por que quarentena e não proibição permanente? Quem tem alguma atuação na Corte sabe que essa prática é totalmente contraproducente. Só os desinformados podem supor que juízes experientes vão se deixar levar por laços de amizade ou de compadrio no momento de proferir decisões importantes. Demais disso, a medida, é completamente inócua pois quem pretende se utilizar desse expediente em desconformidade com mínimos padrões éticos pode muito bem servir-se de terceiros, familiares ou não, para perseguir esse fim. No mais, é necessário registrar que devemos nos esforçar para que os procedimentos de confirmação do indicado pelo presidente da República para o cargo de ministro do STF seja mais rigoroso e com maior participação da sociedade civil. Essa medida, associada ao aumento da idade mínima para o ingresso do candidato e a possibilidade do Senado vetar entendimentos eventualmente afrontosos à Constituição, constituem maneiras mais eficazes para garantir, no âmbito do STF, a independência dos juízes e decisões mais justas e adequadas à Constituição.


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