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Sérgio 14 ENTREVISTA Coordenador do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, o sociólogo Sérgio Adorno sugere um novo discurso para tratar do tema no Brasil, inclusive com o objetivo de influenciar a forma como políticas para segurança pública são planejadas e executadas. Doutor em Sociologia pela USP, ele entende que novas alternativas devem articular a proteção de direitos humanos com a garantia de lei e ordem. Cético ao falar da intervenção federal no Rio de Janeiro, defende uma série de ajustes em diferentes vetores: sistema prisional, processo penal, formas de julgamento e aplicação de penas, organização das polícias e a coordenação entre Estados e a União. O Rio de Janeiro passa por uma intervenção federal com emprego das Forças Armadas em segurança pública. Esse tipo de ação tem chance de oferecer bons resultados? À primeira vista, não há sólidas evidências de que essa operação produzirá os efeitos esperados. Em primeiro lugar, a despeito da atual crise de segurança pública por que passa o Estado do Rio de Janeiro – é inegável reconhecer –, em períodos anteriores, como na década de 1990, as taxas de homicídios eram mais elevadas, em torno de 60 homicídios por 100.000 habitantes, praticamente o dobro das taxas atuais. Em segundo lugar, não houve sustentabilidade das experiências anteriores de intervenção das Forças Armadas por ocasião da Rio92 ou dos eventos olímpicos. O fim das operações foi seguido pelo retorno ao estado beligerante que antes já predominava nas favelas e se espraiava pelas ruas da cidade do Rio de Janeiro. Ademais, tomar a participação do Exército brasileiro no Haiti como exemplo de sucesso não parece apropriado. Houve meses de planejamento antes da intervenção, o controle do crime urbano não oferecia os mesmos desafios que oferece no Brasil em virtude da magnitude e complexidade da chegada do crime organizado aqui. No Haiti, boa parte das atividades consistiu em ações de assistência e auxílio humanitário e, por fim, o Exército respondia à ONU. O governo federal criou o Ministério da Segurança Pública. Um vetor federal pode colaborar para organizar políticas de segurança pública mais efetivas? A criação do Ministério é, no mínimo, extemporânea se consideradas as eleições que se avizinham e os nove meses restantes de governo. Há dois problemas fundamentais que precisam ser equacionados. Primeiramente, políticas de segurança devem ser concebidas como políticas de Estado e não de governos. Em segundo lugar, cada vez mais impõe- -se equacionar as relações entre governo federal e governos estaduais. Como rezam os preceitos constitucionais, exceto naqueles crimes cuja competência é dos órgãos federais (Polícia Federal, Ministério Público Federal e Tribunais de Justiça Federais), a segurança pública é do domínio civil e sob responsabilidade dos governos estaduais que, por inúmeras razões, não pretendem perder controle de suas polícias. Nesse sentido, em virtude do pacto federativo, o governo federal não pode impor regras aos governos estaduais. Dadas as mudanças nos padrões de criminalidade e sobretudo da emergência de uma nova economia do crime em torno das organizações criminosas transnacionais, essas relações


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