Audiência pública Jornal do Advogado – Ano XLIV – nº 446 – Fevereiro de 2019
Jornal do Advogado I Fevereiro-2019 07
SÃO PAULO
Em defesa da Justiça do Trabalho
Em meio à polêmica que se instalou no país relacionada à possibilidade
de extinção da Justiça do Trabalho, a OAB São Paulo reuniu,
em 22 de janeiro, membros do universo jurídico durante a primeira
audiência pública da nova gestão, na sua sede institucional. O intuito
foi colher sugestões a partir de análises de vários ângulos, visando
a manutenção desse ramo do Judiciário, bem como do Ministério do
Trabalho, cujo fim foi decretado neste ano. A Ordem paulista entende
que as conquistas civilizatórias obtidas pela sociedade civil merecem
atenção prioritária e proteção.
A diretoria organizou o evento de modo que os participantes interessados
em contribuir com sugestões pudessem se posicionar. “É um
momento de união. Estamos imbuídos em levantar essa bandeira
que pertence à sociedade brasileira. Não se trata de defender, de
modo individualizado, órgãos de classe ou as nossas atividades
profissionais”, pontuou Caio Augusto Silva dos Santos, presidente
da Secional paulista da Ordem. “No Estado Democrático de Direito
não há dúvida em se reconhecer que o cidadão é a maior autoridade.
Não podemos tergiversar e retroceder às conquistas civilizatórias do
mundo contemporâneo.”
Embora não se saiba se a possibilidade de extinção é algo concreto,
ou apenas uma ideia comentada pelo presidente da República, Jair
Bolsonaro, a polêmica está instalada. E levou o universo jurídico a
adiantar-se diante da grave possibilidade de desequilíbrio no sistema
de freios e contrapesos da República.
No entendimento da advocacia, magistrados, professores e representantes
de entidades de classe presentes, a Justiça do Trabalho é fundamental
bastião de defesa de direitos das pessoas na busca por equilíbrio na relação
entre empregados e empregadores, o que permite que o país possa
crescer de forma sustentável. Para o professor da USP, Antonio Rodrigues
de Freitas Junior, que participou de Nova Iorque por Skype, a falta de
deferência relacionada a instituições revela uma narrativa que tem sido
reproduzida em outros países: a de que é possível mexer com a composição
de estruturas da Justiça todas as vezes que estas imponham limites.
Raquel Preto, diretora-tesoureira da OAB SP, reuniu ideias e sugestões
encaminhadas, que resultaram em oito enunciados. Eles foram
apresentados e aprovados na reunião administrativa de gestores da
Ordem em 28/01 (confira na página 11).
Uma sugestão apresentada durante a audiência considerou incentivar o uso
das redes sociais para ampla movimentação nacional em prol da Justiça do
Trabalho, por meio do engajamento de instituições e associações do universo
jurídico. “Pode-se utilizar as redes e ganhar força, chegando à imprensa de
modo a mostrar ao cidadão que há comparações pífias e mentirosas sendo
feitas”, avaliou o professor da PUC-SP, Ricardo Guimarães. Participantes
citaram, em mais de uma ocasião, o fato de que em diversos países, como
Alemanha e França, há articulação com a sociedade.
Magistrados destacaram afirmações que circulam em meio à sociedade e
que não procedem. Uma delas é a de que a Justiça do Trabalho só existe
no Brasil. Guilherme Feliciano, presidente da Anamatra, destacou, para citar
O que se está cogitando é interferência do
Executivo na estrutura do Judiciário. “É muito
grave. Pois a separação de poderes é definida
por cláusula constitucional”, disse Farley
Ferreira, presidente da Associação de Magistrados
Trabalhistas da 2ª Região, na audiência
pública. Segundo o professor Jorge Castelo,
livre-docente pela USP, a estrutura do Poder
Judiciário, em seu núcleo central, não pode ser
objetivo sequer de Emenda Constitucional, sob
pena de violação de cláusula pétrea.
Muitos dos presentes ao debate reforçaram a
necessidade de atenção às discussões e alterações
que vêm surgindo no Direito do Trabalho, a
exemplo da Reforma Trabalhista e da PEC 300.
Além disso, a defesa da Justiça do Trabalho deve
estar atrelada à luta intransigente dos direitos
sociais. “É essencial que a população entenda o
papel da Justiça na garantia dos direitos sociais
do trabalhador”, pontuou Ana Amélia Mascarenhas
Camargos, vice-presidente da Comissão de
Direitos Humanos da Secional paulista da OAB.
Estudiosos da área apontam a importância do
papel de fiscalização realizado pelas estruturas
relacionadas à Pasta do Trabalho. “Fiscalizar
é importante para que a economia funcione
adequadamente. Sem isso, o bom empresário
perde com os que ignoram a legislação”, frisou o
conselheiro Estadual Jorge Boucinhas Filho. O
sistema de defesa desses direitos, e que soma o
Ministério Público do Trabalho, é essencial para
que a economia se articule adequadamente.
Ofensiva de informação
apenas um exemplo, que a Alemanha detém uma estrutura de Justiça do
Trabalho similar à brasileira. Ademais, disse ser irreal informação como a de
que o trabalhador sempre vence as causas. De acordo com dados de 2017
do Conselho Superior de Justiça do Trabalho, as procedências totais (trabalhador
consegue tudo o que pediu) não chegam a 3% do total de demandas.
A presidente do TRT-2, Rilma Hemetério, demonstrou desconforto pela
área sofrer ataques frequentes no país. “Incomoda-nos que a Justiça do
Trabalho, responsável por lidar com direitos alimentares, seja considerada
desnecessária em um país como o Brasil”, afirma. Ela cita que o ranking de
reclamações é liderado por problemas com aviso prévio, multa de 40% do
FGTS e questões relacionadas ao atraso no pagamento de verbas rescisórias.
Interferência indevida
José Luís da Conceição