humanos e a era da inumanidade
de parcerias para fortalecer o empenho nesse campo
de direitos, vide trabalhos em conjunto firmados entre
Ordem e o ente público.
Ainda sob o guarda-chuva de iniciativas ali comentadas,
a diretora da Conectas, Juana Kweitel, destrinchou as
frentes de trabalho desenvolvidas pela ONG. Em meio
às ações, citou as relacionadas à descriminalização
do aborto e à tragédia de Mariana, em Minas Gerais.
“Fizemos uma análise sobre a estrutura das reparações
e tentamos influenciar um novo acordo que estava em
curso entre Ministério Público e empresas, na defesa
dos atingidos”, citou, sobre Mariana.
Papel desafiador
Ainda na manhã do primeiro dia, especialistas em
direito internacional ligados ao campo das garantias
fundamentais, abrangeram o impacto da Declaração
Universal e seus efeitos. O diretor do Centro de Estudos
de Direito e Cultura da Columbia Law School,
Kendall Thomas, disse ser fundamental a participação
da advocacia tanto na defesa dos valores trazidos pelo
documento universal, o que é central na atuação da
classe, como em sua própria disseminação. “O advogado
tem um papel, difícil, de ajudar a construir a cultura
de direitos humanos.”. Ele refletiu, ainda, a respeito
de pensamento que é uma das forças da Declaração
Universal, conforme também citou o professor emérito
da Faculdade de Direito da USP, Celso Lafer, que é o
direito a ter direitos.
Thomas convidou os presentes a pensar sobre os desafios
da construção da cultura dos direitos humanos
nesse momento da história do mundo, a qual classificou
como “era da inumanidade”. Durante sua fala, inclusive,
destacou atuações na trajetória da luta por direitos,
como a de Martin Luther King Jr. e a da vereadora carioca
Marielle Franco, ambos assassinados – ele, nos
EUA, há exatos 50 anos; ela, no Rio, em março deste
ano. Compreendendo que não há, nas sociedades,
quem seja menos ou mais humano do que o outro, eles
representaram vozes e rostos e se puseram a serviço de
processos de luta e de conscientização. Ao convocar a
advocacia para ser força motriz da defesa dos direitos
humanos, Thomas disse que o comprometimento é
testado pela própria vontade de fazer ou não. “Isso
testa nossa própria humanidade”, finalizou.
A aplicação da lei não pode ser confundida com desrespeito
a valores e dignidade humana. O criminalista
Antonio Cláudio Mariz de Oliveira analisou os reflexos
do comportamento da sociedade e do Estado no tratamento
dado ao combate à criminalidade, abordando
o sistema penitenciário. A estrutura estrangulada do
sistema no país produz criminosos e resultou na morte
de mais de cem detentos só em 2017, em episódios que
atentaram para a guerra entre as facções criminosas
dentro das carceragens. No Brasil, há cerca de 400 mil
vagas para população superior a 600 mil presos, em
cenário que, segundo ele, evidencia desumanidade e
cultura de punição a qualquer custo. “Esse sistema
trabalha contra os próprios objetivos: diz querer, no
texto da Lei de Execuções Penais (LEP), recuperar o
homem. Mas, esquece-se dele”, disse. “Contrariamente
aos direitos humanos, se deseja impingir ao condenado
um sofrimento maior que a aplicação a Lei.”
O ex-juiz da Corte Internacional de Justiça das Nações
Unidas, Francisco Rezek, chamou a atenção dos presentes
para a ojeriza que existe por parte da população
sobre o ativismo pró-direitos humanos. “É preciso
entender esse fenômeno”, acentuou. Uma causa, em
sua visão, é a quantidade de distorções sobre discursos
a respeito da temática em todo o mundo. “A
universalidade desses direitos, dos seus sentidos derivados,
significa também isso: não podemos escolher
seletivissimamente, à luz da nossa concepção política
ideológica, aqueles direitos que vamos proteger, e em
nome de cuja proteção vamos nos dar a liberdade de
pisotear outros direitos humanos de quem esteja do
lado oposto ao nosso.”
Já Celso Lafer, ao contextualizar o momento histórico
da elaboração da Declaração Universal em sua
explanação, destacou o que considera três marcos do
documento: a concepção de crimes contra a humanidade,
a prevenção e eliminação do crime de genocídio
e a dimensão de abrangência e visão de conjunto. Por
fim, o ex-ministro da Justiça no governo de Fernando
Henrique Cardoso, José Carlos Dias, relembrou a empenhada
trajetória da advocacia brasileira em favor do
resgate e respeito às garantias fundamentais durante
difíceis períodos para o país, a exemplo da época da
ditadura militar.
“Vivemos um momento em que temos de garantir o
nosso cotidiano com o compromisso pela democracia.
Esta é uma razão de ser da nossa existência. Não podemos
rasgar tudo aquilo que foi escrito pelos nossos
antecessores, não podemos esquecer inclusive que
esta Casa tem uma história a contar”, disse. “Temos um
compromisso com as novas gerações.”. Ele reforçou
ser inadmissível admitir que se refaça no Brasil a violência
e desrespeito a garantias praticados no passado.
Na abertura dos trabalhos, Marcos
da Costa renovou o compromisso da
advocacia e da instituição na defesa
dos direitos humanos: “Procuramos
fazê-lo por todas as vertentes
possíveis”
José Luís da Conceição
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Jornal do Advogado – Ano XLIV – nº 445 – DEZ-2018/JAN-2019
SÃO PAULO
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